O CARF em 2020: breve retrospectiva jurisprudencial – 12/01/2021

O novo ano que se avizinha e o clima de renovação contagia a todos, com a esperança de tempos melhores diante dos novos desafios impostos e que serão superados no decorrer deste novo período.

Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que vivemos uma pandemia do novo coronavírus, chamado de Sars-Cov-2. Assim, logo no início do ano estávamos diante da maior pandemia em número de fatalidades dos últimos cem anos, assim como diante de severos impactos econômicos e fiscais.

No âmbito do Carf, a Portaria nº 7.485/2020[1], publicada no dia 13 de março de 2020, foi a primeira a estabelecer as medidas temporárias de prevenção ao contágio pelo Covid-19, restringindo o acesso ao plenário de julgamento apenas aos patronos com processos pautados.

Entretanto, mesmo diante de tal cenário, o Carf apresentou um aumento em sua produtividade de 100%, comparando o mês de junho de 2020 com o de 2019, em relação ao quantitativo de processos julgados[2].

Nesse sentido, cumpre rememorar algumas decisões proferidas pelo Tribunal Administrativo no ano de 2019.

Começando pelo acórdão nº 9101-005.180, proferido pela Primeira Turma da CSRF na sessão do dia 07 de outubro de 2020 que, por voto de qualidade, aplicando o disposto no art. 19-E da Lei nº 10.522/2002, acrescido pelo art. 28 da Lei nº 13.988/2020, entendeu que a CSLL não incide sobre o resultado positivo (superávit) apurado por entidade de previdência privada complementar fechada.

Isso porque, segundo os conselheiros, o fato gerador da CSLL decorre do exercício de atividade empresarial que tenha por objeto ou fim social a própria obtenção de lucro, atividade esta que resta incompatível com o regime jurídico de uma entidade de previdência privada complementar fechada, uma vez que sua finalidade social é de interesse público.

Neste sentido, tendo em vista que a finalidade essencial das entidades em questão é a de complementar os programas previdenciários oficiais, sem a possibilidade de ter finalidade lucrativa, nos termos do art. 4º, I, § 1º, da Lei nº 6.435/1977, é que o superávit não se encontra no campo de incidência da CSLL.

E ainda da Primeira Turma da CSRF, temos o acórdão nº 9101-005.164, agora envolvendo a atividade de factoring, também à qualidade entendeu que contrato de factoring contendo cláusula de regresso contra o cedente não desnatura a operação, nem faz com que as receitas decorrentes de devam ser tratadas, para fins tributários, como receita bruta da atividade da pessoa jurídica.

Isso porque, segundo os conselheiros, considera-se resultado da atividade de factoring, passível de tributação pela presunção prevista no art. 15, § 1º, III, “d”, da Lei nº 9.249/1995, as receitas decorrentes da atividade operacional, sendo assim também consideradas as receitas dos contratos cujas cláusulas imponham regresso e transfiram os riscos da atividade ao cedente em caso de inadimplemento do devedor.

No tocante a motivação do auto de infração por ausência de provas, na hipótese em que a Administração Tributária deu causa à situação, acórdão nº 9101-004.937, a Primeira Turma da CSRF à unanimidade entendeu que a autuação deveria ser cancelada por vício material.

No caso concreto, os Conselheiros consignaram que a intimação ao contribuinte para apresentação de provas se deu em endereço desatualizado, sendo que fora solicitada pelo sujeito passivo a alteração de endereço na Receita Federal do Brasil, e que, além de a decisão de primeira instância ter se manifestado a respeito de questão estritamente de direito, apenas com a decisão de segunda instância houve manifestação a respeito de produção probatória, restando evidente o cerceamento do direito de defesa do contribuinte.

Em relação às matérias de competência da Segunda Seção do Carf, destacamos o acórdão nº 2402-008.958, firmando entendimento à qualidade, pela inexigibilidade do ITR na hipótese em que o imóvel tenha sido invadido pelo Movimento Sem Terra (MST) antes da ocorrência do fato gerador.

No caso concreto, os conselheiros consignaram que o contribuinte logrou êxito em comprovar que, à época do fato gerador, não detinha a posse do imóvel, uma vez que este foi invadido pelo MST, fato suficiente para afastar a exigibilidade do crédito, ante à ilegitimidade do sujeito passivo.

No caso das receitas decorrentes da venda de produtos ao exterior, através de trading companies, seguindo o entendimento firmando pela Corte Suprema no RE 759.244, submetido ao rito da repercussão geral, o acórdão nº 2301-007.420, consubstanciando entendimento no sentido de que tais receitas não integram a base de cálculo das contribuições previdenciárias.

Por sua vez, o acórdão nº 2301-007.772 consignou que as discussões que envolvam as competências para lançamento e execução do tributo não podem ser suscitadas de ofício, uma vez que não constituem matéria de ordem pública.

Isso porque, segundo os conselheiros julgadores, a incompetência absoluta de que trata o art. 64 do CPC/2015 é aquela relacionada à atividade judicante e não inclui as competências para o lançamento e execução do tributo.

No que diz respeito à Terceira Seção do Carf, podemos destacar o acórdão nº 9303-010.844, qualificado, entendeu pela não incidência do PIS sobre os atos cooperativos típicos realizados pelas cooperativas de crédito com os seus associados.

Para o exame da incidência de PIS e da Cofins sobre as receitas decorrentes de juros de mora, em contrato de mútuo inadimplido, temos o acórdão nº 3201-007.163, que à qualidade firmou posicionamento no sentido de que sobre tais valores há a incidência do PIS e da Cofins.

Isso porque, segundo os conselheiros, mesmo considerando a inconstitucionalidade reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 585.235, submetido à sistemática da repercussão geral, quanto ao alargamento da base de cálculo do PIS e da Cofins promovido pelo art. 3º, § 1º, da Lei nº 9.718/1998, há de se reconhecer que a grandeza “faturamento” ou “receita bruta” alcança o produto do exercício da atividade empresarial típica ou operacional da pessoa jurídica, abarcando, por conseguinte, o gerenciamento da captação de recursos a serem aplicados nas empresas controladas, quando tal atividade é parte inerente do objeto social do sujeito passivo.

Por fim, mas não menos importante, registramos posicionamento da Terceira Turma da CSRF, constante no acórdão nº 9303-010.318, que por voto de qualidade entendeu que a compensação entre tributos da mesma espécie não demonstra qualquer ilegalidade, ainda que haja provimento judicial transitado em julgado com referência somente à restituição dos créditos, inclusive por se tratar de crédito líquido e certo.

Isso porque, segundo os conselheiros, na vigência do regime de auto compensação escritural, por serem da mesma espécie e destinação constitucional, os créditos certos e líquidos da contribuição para o FINSOCIAL podiam ser compensados com os débitos da Cofins pelo próprio contribuinte, mediante registro na sua escrituração contábil, porém, limitada a compensação dos débitos aos valores dos créditos comprovados.

À guisa de conclusão, o desenvolvimento econômico nacional é um dos principais objetivos almejados pela Constituição Federal. Entretanto, há que se ter em mente que esse conceito não se confunde com o mero crescimento econômico, representado pelo aumento arrecadação e indicadores econômicos.

Isso porque, além dos indicadores econômicos, o que caracteriza o desenvolvimento econômico é a diminuição dos níveis de pobreza, desemprego e desigualdade, bem como a melhoria das condições de saúde, educação, moradia e transporte e não o mero impulsionamento de arrecadação estatal.

Fonte: CARF