CRÉDITOS DE IPI SOBRE PRODUTOS FINAIS NÃO TRIBUTADOS

O artigo 153, § 3º, II, da Constituição Federal, dispõe que o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, submete-se ao regime não cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado anteriormente.

Cediço que o regime não cumulativo, visando atenuar o efeito cascata, admite o aproveitamento de créditos, logo, em decorrência da não cumulatividade do Imposto sobre Produtos Industrializados o montante do imposto devido pela venda das mercadorias é compensado com aquele pago nas operações anteriores.

Não obstante, há produtos industrializados com insumos tributados pelo IPI, mas cuja saída é isenta, com alíquota zero ou não tributada, situação que gera saldo credor que não poderia ser aproveitado, haja vista a ausência de pagamento do imposto ao final da cadeia produtiva.

Diante desse fato, visando a efetiva observação ao regime não-cumulativo, o artigo 11 da Lei 9.779/99, estabelece o direito à manutenção dos créditos de IPI nas saídas em que não for possível ao contribuinte compensar o saldo credor do tributo, inclusive nas hipóteses de produtos isentos ou tributados à alíquota zero, veja:

Art. 11.  O saldo credor do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, acumulado em cada trimestre-calendário, decorrente de aquisição de matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, aplicados na industrialização, inclusive de produto isento ou tributado à alíquota zero, que o contribuinte não puder compensar com o IPI devido na saída de outros produtos, poderá ser utilizado de conformidade com o disposto nos arts. 73 e 74 da Lei no 9.430, de 27 de dezembro de 1996, observadas normas expedidas pela Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.

Logo, o dispositivo acima referido dá solução às hipóteses em que o montante do imposto decorrente da compra de insumos não puder ser aproveitado na venda de mercadorias/produtos, asseverando a manutenção dos créditos de IPI (saldo credor), que serão passíveis de ressarcimento ou compensação com outros tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Ocorre que o referido dispositivo não mencionou expressamente a hipótese em que o produto industrializado é não-tributado na saída, por esse motivo, a Secretaria da Receita Federal do Brasil tem entendido que não seria possível aproveitar o crédito do IPI adquirido com a aquisição de insumos, nas saídas dos produtos não-tributados – NT, fazendo uma interpretação literal e restritiva da norma, vedando o aproveitamento de créditos por entender que a norma apenas poderia ter aplicabilidade nos casos de produtos isentos ou tributados com alíquota zero.

Inclusive, a súmula 20 do CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS – CARF, assevera que “Não há direito aos créditos de IPI em relação às aquisições de insumos aplicados na fabricação de produtos classificados na TIPI como NT.”

Contudo, nota-se que o termo “inclusive” alocado no texto da lei acima transcrito, permite concluirmos por uma abordagem mais abrangente da norma por simples interpretação finalista do texto da lei, sem, contudo, restringir a finalidade da norma a luz da Constituição Federal. Verifica-se claramente a intenção do legislador em manter o crédito de IPI ainda que na saída não haja incidência do IPI sobre o produto industrializado, seja porque são isentos, sujeitos à alíquota zero ou não-tributados.

Logo, verifica-se que a Secretaria da Receita Federal do Brasil tem dado interpretação inadequada ao tema, repisa-se que a interpretação literal e restritiva aplicada pela Receita Federal não é compatível com a finalidade da norma.

Tanto é assim, que no julgado dos Embargos de Divergência em RESP nº 1.213.143/RS, o STJ, interpretou o art. 11 da Lei 9.779/1999 para reconhecer o direito ao aproveitamento dos créditos de IPI, originários da aquisição de insumos, de matérias-primas e de produtos intermediários tributados, utilizados na industrialização de produtos não-tributados.

Ademais, recentemente o Superior Tribunal de Justiça afetou o REsp nº 1976618/RJ (2021/0089631-1) e o REsp nº 1995220/RJ (2022/0096121-8) como recursos representativos da controvérsia nº 577, a fim de definir sobre a possibilidade ou não de se estender o creditamento de IPI previsto no art. 11, da Lei nº 9.779/99, também para os produtos finais não tributados (NT), imunes, previstos no art. 153, § 3º, da CF/88.

À vista disso, ante a equivocada interpretação da Receita Federal sobre o tema, espera-se que ao final do julgado da controvérsia nº 577 o Superior Tribunal de Justiça possa estabelecer a manutenção dos créditos de IPI, oriundos aquisição de insumos, de matérias-primas e de produtos intermediários tributados, utilizados na industrialização de produtos não-tributados.

ANA LAURA MARTELI DE OLIVEIRA é advogada na Jorge Gomes Advogados, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente. Pós-graduanda em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET.