A LEI 14.789/2023 E A TRIBUTAÇÃO DOS BENEFÍCIOS FISCAIS DE ICMS PELO IRPJ E CSLL

No último dia útil de 2023 foi publicado no Diário Oficial da União a Lei 14.789/2023, resultado da conversão da Medida Provisória nº 1185/2023 e que traz profundas alterações na tributação dos benefícios fiscais de ICMS pelo IRPJ e pela CSLL.

O objetivo do presente texto é sintetizar as principais alterações promovidas, bem como trazer as primeiras impressões sobre as discussões que estas alterações suscitarão.

Referida lei trouxe uma série de restrições até então inexistentes, a iniciar pela especificação dos conceitos de subvenção para implantação de empreendimento e subvenção para expansão de empreendimento.

Define subvenção para implantação como aquela destinada ao estabelecimento de empreendimento econômico para o desenvolvimento da atividade a ser explorada por pessoa jurídica não domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção.

De outro lado, conceitua a subvenção para expansão como aquela destinada a ampliação da capacidade, a modernização ou a diversificação do comércio ou da produção de bens ou serviços do empreendimento econômico, inclusive mediante o estabelecimento de outra unidade, pela pessoa jurídica domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção.

Com isso, fica excluído da sistemática veiculada pela lei todo e qualquer outro tratamento diverso dos destinados à implantação ou expansão, ou seja, benefícios fiscais destinados ao custeio não estão contemplados.

Outra mudança significativa é a exigência expressa de que o ato editado pelo Estado da Federação concessivo da subvenção seja anterior à implantação ou expansão do empreendimento, ou seja, não se enquadra na sistemática da lei quando o ato concessivo do benefício seja posterior à implantação ou expansão do empreendimento.

Exige-se também que o ato concessivo da subvenção editado pelo Estado da Federação estabeleça expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas pela pessoa jurídica relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.

O atendimento a todos os requisitos enumerados é condição para o deferimento do pedido de habilitação, pela Receita Federal do Brasil, feito pelo contribuinte para poder se beneficiar do crédito concedido.

Aqui cabe explicar que pela nova sistemática, o valor das subvenções passa a ser tributado pelo IRPJ, pela CSLL, pelo PIS e pela COFINS, de modo que, se atendidas algumas exigências, concede-se ao contribuinte um “benefício fiscal” correspondente a um direito de crédito sobre parte deste tributo pago, correspondente a 25% a título de IRPJ.

Tem-se então uma alteração de perspectiva, em que se passa a considerar a subvenção como integrante da receita e do resultado do contribuinte, sujeito à tributação pelo PIS, COFINS, IRPJ e CSLL, ao passo em que, se atendidas algumas exigências, devolve-se ao contribuinte parte desta tributação por meio de créditos passíveis de serem utilizados para compensação com outros tributos ou ainda mediante ressarcimento.

O aludido crédito fiscal corresponderá ao produto das receitas de subvenção e da alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) relativa ao IRPJ e deverá ser apurado na ECF relativa ao período de apuração de reconhecimento das receitas de subvenção.

Todavia, o crédito fiscal não se aplica indiscriminadamente sobre as receitas de subvenção, sendo ainda exigido que estas receitas estejam relacionadas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico, e ainda, que sejam reconhecidas após o protocolo do pedido de habilitação da pessoa jurídica perante a Receita Federal do Brasil.

Exige-se ainda que estas receitas sejam relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital, relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.

Assim, se um determinado bem de capital é adquirido a vista, o valor do crédito não poderá levar em consideração o valor da aquisição, mas sim as despesas de depreciação, amortização ou exaustão, conforme o caso, alongando no tempo a fruição do benefício.

Ou seja, receitas de subvenção utilizadas em qualquer outra finalidade diversa das especificadas não podem ser consideradas para fins do crédito tributário, afastando do benefício, por exemplo, valores empregados na aquisição de softwares, reforço de estoques, pesquisa, desenvolvimento e inovação, dentre tantas outras finalidades que podem ser estratégicas para a implantação ou expansão de um empreendimento.

Por outro lado, de maneira que pode indicar uma contradição, a lei dispõe que a exigência não se aplica na hipótese de subvenção relacionada a bem não sujeito a depreciação, amortização ou exaustão, o que pode indicar que, desde que devidamente comprovado, o tratamento também poderia ser aplicável a investimentos destinados a outras finalidades.

Exige-se ainda que as receitas de subvenção tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), todavia, este cômputo não deve ser realizado nos estimativas mensais, mas apenas no ajuste anual.

Não poderão ser computadas na apuração do crédito fiscal as receitas que superarem as despesas de depreciação, amortização, exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital, relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.

Também não podem ser computada a parcela das receitas que superar o valor das subvenções concedidas pelo ente federativo.

Após a apuração e informação do crédito fiscal à Receita Federal do Basil, o contribuinte poderá utilizá-lo para compensação com débitos próprios, relativos a tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, ou ainda, mediante ressarcimento em dinheiro, este último, somente possível após o 24º (vigésimo quarto) mês após o reconhecimento das receitas.

A norma condiciona que o pedido de ressarcimento e a declaração de compensação somente serão recepcionados após reconhecimento das receitas de subvenção para fins de tributação.

Observa-se que pela sistemática estabelecida o contribuinte apura PIS e COFINS durante o exercício, apura o IRPJ e a CSLL no ajuste anual, mas somente depois disto, se atender todas as condições estabelecidas, pode começar a pleitear os créditos para compensação.

Se não for possível compensar, deverá ainda aguardar 24 meses para obter o ressarcimento.

Prevê ainda que o crédito fiscal compensado ou ressarcido ao contribuinte não se sujeitará à incidência de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

A lei ainda revogou alguns dispositivos de outras leis, com relevantes impactos sobre a tributação das subvenções fiscais pelo IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, a saber:

  1. A determinação de que as subvenções não devessem ser computadas no lucro real e que deveriam ser excluídas do lucro líquido;
  2. As determinações de que as subvenções não devessem ser computadas na base de cálculo do PIS e da COFINS.
  3. A determinação de que os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiros fiscais relacionados ao ICMS, quando concedidos como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos, seriam considerados subvenção para investimentos, com a vedação de exigência de outros requisitos que não os estipulados no art. 30 da Lei 12.973/2014.

A natureza das alterações implementadas apontam para a necessidade de uma análise detalhada de cada situação concreta, na medida em que as características dos benefícios fiscais de cada contribuinte alteram seu enquadramento na nova legislação.

De toda forma, a nova sistemática incide em uma série de irregularidades que já podem ser identificadas e cuja discussão necessariamente deverá ocorrer perante o Poder Judiciário.

Essas irregularidades gravitam em torno da indevida pretensão da União tributar os benefícios fiscais concedidos pelos Estados, o que atenta contra o pacto federativo, a autonomia dos Estados, bem como contra decisões já proferidas anteriormente em casos semelhantes.

THIAGO BOSCOLI FERREIRA, é Advogado, sócio da Jorge Gomes Advogados, Juiz Contribuinte no Tribunal de Impostos e Taxas – TIT, professor de Direito Tributário, Especialista em Direito Tributário e Mestrando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET.