O ITR e a sua nefasta realidade

Rompendo o vetusto liberalismo econômico que se implantou no regime das propriedades rurais no Brasil, procurou-se através da Lei nº 4.504/64, estabelecer um conjunto de medidas que possibilitasse promover uma melhor distribuição da terra. Introduziram-se modificações de regime de posse e uso da terra rural, contrárias àquela política liberal, a fim de atender-se aos princípios da Justiça Social e ao aumento da produtividade.

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Após esta feita, tendo em vista a magnitude que o tema se perfaz, os princípios acima mencionados começaram a fazer parte também de nossos textos constitucionais.
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A esse pretexto, foi criado, inclusive, o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR.
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Contudo, após vários anos sob o total controle da União, o ITR já não despertava mais o mesmo olhar atencioso por parte da nossa República, principalmente pela grande dificuldade de se realizar a fiscalização e cobrança em um País com dimensões tão expressivas como o nosso. Por essa razão, através da Lei nº 11.250/05, a União outorgou à Receita Federal do Brasil – RFB, a possibilidade de “terceirizar” aos municípios, a cobrança e a arrecadação do ITR.&#160
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Desta forma, todos os municípios que firmassem o convênio com a Receita, ficariam aptos s cobrar o imposto em questão e ficar com o produto da arrecadação. Até ai, não haveria qualquer problema.
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Entretanto, está havendo uma errônea interpretação, por parte dos municípios, da extensão do que foi lhes foi delegado por parte da União Federal, através do convênio celebrado com a Receita Federal. Ora, como não poderia ser diferente, a delegação se deu apenas e tão-somente no que se refere competência tributária material, ou seja, apenas a arrecadação e a fiscalização, em nada inovando no tocante a competência legislativa.&#160
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Por essa razão é que os problemas começam a surgir. O primeiro deles se refere a confusão praticada pelas Prefeituras, relativamente a forma de lançamento do IPTU e do ITR, equiparando os dois, sem se atentar para a absoluta diferença de suas características. Enquanto o IPTU é um tributo cujo lançamento se dá de ofício, ou seja, a autoridade fiscal procede ao lançamento mediante valores já fixados e determinados em processo legislativo o ITR é um imposto no qual o lançamento é por homologação, hipótese na qual o contribuinte atribui o valor que entende devido e a administração tributária o homologa, ou não.&#160
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Assim, sempre tendo como pressuposto a ânsia de se arrecadar cada vez mais, foram criados dois instrumentos de controle de preço de terra nua, sendo um municipal e outrofederal, o famoso SIPT (Sistema de Preços de Terras). Eis aqui mais uma incongruência.&#160
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Analisando a legislação de grande parte das prefeituras, deparamo-nos com casos típicos de extrapolação de competência material. Referidos municípios, depois de firmarem convênio com a Receita, editaram decretos fixando o valor da terra nua por hectare, para fins de lançamento do ITR. Obviamente, nessa fixação de valores houve, na maioria dos casos, um aumento desproporcional dos valores dos imóveis.&#160
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Neste sentido, quando os contribuintes vão proceder à sua Declaração do ITR, informando o valor que entende ser aquele que melhor se verifica em sua área rural, estando este em desacordo com aquele levantado por determinado Município, o sistema sequer reconhece a sua declaração.
Assim, na medida em que o contribuinte lance, em sua declaração, o valor da terra nua em desacordo com aquele “pautado” por determinada Prefeitura, o mesmo será intimado a dar explicações e deverá fazer a sua contraprova através de laudo de avaliação elaborado de acordo com a norma ABNT 14653-3. Como se pode abstrair, o laudo já foi determinado como hipótese de gerar enorme trabalho e dificuldade, além do seu custo, o que provavelmente gerará um desestímulo de recursos por parte dos contribuintes.
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Ora, em momento algum se alterou a forma de lançamento do imposto por homologação. A existência do Sistema de Preço de Terras tem como objetivo fornecer informações relativas a valores de terras para o cálculo e lançamento do ITR nos casos de revisão ou ante a omissão de lançamento de ofício.&#160
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Jamais podemos perder de vista que o lançamento por homologação, a que o ITR é afeto, empresta ao contribuinte o início do lançamento e, com ele, a presunção de boa-fé e legalidade inerente aos atos jurídicos. Neste panorama, o lançamento realizado pelo produtor rural, poderá até ser questionado pela administração pública, porém o ônus da prova em demonstrar o erro será dela. Eis aqui, uma diferença primordial.
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E, considerando, que a própria Administração já elegeu a norma da ABNT 14653-3 como instrumento para que o contribuinte deva promover a sua contraprova, o mesmo instrumento deveria ser utilizado para a própria Administração demonstrar a sua discordância perante o valor declarado pelo produtor rural e não o contrário, o que acaba por se demonstrar em mais um instrumento coercitivo para a cobrança de mais esse imposto, conforme, infelizmente, já se tornou prática em tantos outros.&#160
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LUIZ PAULO JORGE GOMES, é Advogado, sócio da Jorge Gomes Advogados, Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP.
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