IMUNIDADE DO FUNRURAL NAS EXPORTAÇÕES REALIZADAS POR COOPERATIVAS

Como é sabido, o Brasil é um dos líderes mundiais em exportação de produtos agropecuários, sendo um dos maiores exportadores de grãos e proteína animal do mundo.

Todavia, pela dinâmica do mercado externo, nem todo produtor rural, especialmente o pequeno e médio, logra êxito em concretizar o escoamento de seus produtos ao exterior, vez que o seu nível de produção é inferior ao que usualmente é requisitado pelos agentes econômicos internacionais.

Tendo isso em mente, muitos produtores rurais, pequenos e médios, se organizam em sociedades cooperativas, cuja finalidade é justamente aglutinar a produção dos produtores rurais, a fim de viabilizar e concretizar a venda dessa produção ao mercado externo.

Nesse contexto, o produtor rural entrega seus produtos à cooperativa, a qual, em proveito comum de seus cooperados, concretiza a venda ao exterior, tanto diretamente (a própria cooperativa realiza a venda ao agente externo), quanto indiretamente, por meio de uma trading company ou empresa comercial exportadora – ECE (cooperativa utiliza de empresas especializadas para escoar a mercadoria ao mercado externo).

Ocorre, contudo, que muito se tem questionado se a exportação concretizada por referidas cooperativas está resguardada pela imunidade tributária prescrita pelo artigo 149, § 2º, I, da Constituição Federal, que trata justamente das receitas decorrentes de exportação, no que diz respeito ao Funrural.

Antes de expostas as premissas para sanar a dúvida, é importante trazer que o Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) é uma contribuição social de caráter previdenciário, incidente sobre a receita bruta da comercialização da produção rural. Ou seja, a materialidade da contribuição ao Funrural é o comércio da produção fruto da atividade rural.

Pois bem.

Para responder ao questionamento, é indispensável estabelecermos duas premissas.

A primeira delas consiste no fato de que o STF, ao julgar o RE nº 759.244/SP, se posicionou que a regra da imunidade das receitas oriundas das exportações deve alcançar não apenas as operações de exportação direta (onde o produtor rural exporta diretamente para o mercado externo), mas também as operações de exportação indireta (quando o produtor rural utiliza de um agente intermediário para concretizar a exportação). Ou seja, trata-se de regra imunizante de natureza objetiva, incidindo sobre o bem objeto da exportação, pouco importando o sujeito que concretiza a exportação.

Para o STF, onerar a tributação indireta, acabaria desvirtuando a própria finalidade da imunidade, porquanto o ônus tributário inevitavelmente repercutiria no preço da mercadoria.

A segunda, por sua vez, se relaciona com a natureza do ato de entrega de sua produção, pelo produtor rural, para as cooperativas, a fim de que elas, em proveito dos cooperados, concretizem a exportação.

De acordo com artigo 79, da Lei nº 5.764/71 , referido ato consiste em um ato cooperativo, não podendo ser considerado como se fosse um ato de mercado (comercialização). Logo, sob essa ótica, não haveria que se falar em incidência do Funrural nessa etapa da cadeia de exportação, justamente pela ausência da comercialização da produção rural.

Restaria, assim, analisar se a exportação concretizada pela cooperativa, seja direta ou indireta, com o auxílio de tranding companies ou outras empresas especializadas, estaria imune da incidência do Funrural, em razão da regra de imunidade prevista na Constituição Federal.

Ao se posicionar sobre o tema, através da Solução de Consulta COSIT 149, de 24 de julho de 2023, a Receita Federal do Brasil sustentou ser devida a contribuição ao Funrural sobre essas operações, não havendo a incidência da regra imunizante.

Todavia, a posição da RFB está equivocada justamente por deixar de observar as duas premissas expostas acima: a norma imunizante é de natureza objetiva, incidindo sobre o bem objeto da exportação, buscando a completa desoneração das mercadorias enviadas ao mercado externo, sendo irrelevante se a exportação for realizada diretamente pelo agente exportador, ou de forma indireta, com o uso de tranding companies ou empresa comercial exportadora, e; a natureza de ato cooperativo na relação produtor rural cooperado-cooperativa.

Assim, a intermediação entre o produtor rural que entrega seus produtos à cooperativa, a qual, em proveito comum de seus associados, concretiza a venda ao exterior por meio de uma trading company, não desnatura a finalidade do texto constitucional quanto à imunidade tributária, configurando uma modalidade de exportação indireta.

Quando a cooperativa concretiza o escoamento dos produtos rurais ao mercado externo, diretamente ou indiretamente, com o auxílio das sociedades empresárias especializadas, seria como se fosse o próprio produtor rural o fazendo.

Recentemente, em abril do ano corrente, o STF se posicionou favoravelmente aos contribuintes ao analisar o caso de uma cooperativa agrícola do Rio Grande do Sul, ratificando e aplicando ao caso justamente as premissas expostas acima.

A conclusão não poderia ser mais singela: independente da forma que se olha, às exportações de produtos agropecuários por meio de cooperativas deve ser reconhecida a imunidade prevista pelo artigo 149, § 2º, I, da CF.

Diante do cenário exposto, a Jorge Gomes Advogados, especializada na atuação do contencioso tributário a administrativo, coloca-se à disposição para tirar eventuais dúvidas sobre o tema.

HEITOR JOSÉ SCALON RIBEIRO é advogado na Jorge Gomes Advogados, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente. Pós-graduando em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Tributário – IBET.