Aqui não somos inimigos, somos todos brasileiros! ITBI e a posição dos Municípios ante a norma imunizante

Na próxima segunda, dia 15 de novembro, será comemorado, com louvor, o dia da Proclamação da República, que descrito em breves linhas ocorreu por meio de um golpe de estado, na qual um grupo de militares do exército brasileiro liderados pelo Marechal Manuel Deodoro da Fonseca destituiu o então imperador, Don Pedro II, e instituiu o governo republicano provisório, nasceria a República Federativa dos Estados Unidos do Brasil. Este evento é sem dúvida, um dos mais importantes na história do nosso país.

O objetivo central que levou a necessidade da aclamação “Viva a República” tem-se que, a disciplina, a ordem, a democracia e o progresso social, eram os maiores alvos perseguidos pelos republicanos, que pretendiam retirar do poder a monarquia, que já havia perdido prestígio e apoiadores, justamente, por não propiciar desenvolvimento ao país que se assolava por instabilidades econômicas e sociais, dentre outras questões.

Esta breve introdução escora a análise traçada a seguir, a respeito da desídia na aplicação dos princípios mais basilares da República e, por mais incrível que pareça, por aqueles que têm o dever Constitucional, não só observá-los, mas de buscar sua efetiva concretização.

A Constituição Federal concentra o núcleo das leis fundamentais que organiza e rege o funcionamento do Estado brasileiro e, mesmo pertencendo a este lugar máximo e de prestígio, infelizmente, muitas vezes é ignorada a bel prazer do aplicador (note-se o ranço da monarquia) – que busca dar interpretação extremamente parcial e desarmoniosa da norma constitucional.

Um grande exemplo desta afronta constitucional está relacionado às hipóteses de imunidade da cobrança do ITBI (imposto incidente sobre operações onerosas de bens imóveis), atualmente plasmadas na Constituição Federal em seu artigo 156, §2º, inciso I, ao dispor que: a) não incide o tributo – imunidade incondicionada – nos casos de transmissão de bens ou direito incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital; b) para os casos de transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, desde que não se constate o exercício de atividades preponderantes de compra e venda, locação ou arrendamento mercantil.

O imbróglio jurídico diz respeito à equivocada análise, feita pelos entes municipais, a respeito da norma constitucional, uma vez que pretendem aplicar a exceção, exclusivamente relacionada para os casos de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica que se dediquem às atividades de compra, venda, locação ou arrendamento mercantil, de forma preponderante. Uma simples leitura do texto constitucional conduz à única interpretação possível no sentido de que a imunidade é ampla e incondicionada e que a “extensão” da exceção para todas as hipóteses mostra-se como claro desvio do espírito republicano.

Neste cenário, vê-se esvair pelos dedos da democracia e da legalidade, as máximas e princípios perseguidos na instituição do regime republicano no Brasil, verdadeira afronta, não apenas a todos os cidadãos, mas ao próprio Estado Democrático de Direito.

Resta aos cidadãos se oporem às posturas antirrepublicanas das Dignas Municipalidades, em clara ofensa à Constituição Federal, assim como fez Floriano Peixoto, então comandante militar do império, que ao receber ordem dadas pelo Visconde de Ouro Preto – Chefe do Gabinete Imperial – para enfrentar os amotinados republicanos e ser incitado de que havia enfrentado tropas bem mais numerosas na Guerra do Paraguai, justificou sua insubordinação respondendo: “Sim, mas lá (no Paraguai) tínhamos em frente inimigos e aqui somos todos brasileiros!”.

Portanto, sob este prisma, se os representantes municipais olhassem para os cidadãos/contribuintes do Brasil não como inimigos, mas como parte do mesmo grupo, como brasileiros, dos quais não possuem qualquer diferenciação, e sem a pretensão e visão imperialista de, por convicções próprias, tentar se aproveitar daqueles que teoricamente são subordinados – Município tributa, contribuinte paga -, experimentar-se-ia, efetivamente, uma democracia de paz e harmonia, o oposto deste cenário relacionado à cobrança ilegal do ITBI em caso constitucionalmente imunizado.

Como este caminho ideal não está sendo seguido pelas autoridades públicas, não resta alternativa aos contribuintes, senão, lutar e postular, novamente, por direitos e garantias fundamentais cristalizados na Constituição Federal, por meio do Poder Judiciário. Ainda que o caminho possa não ser fácil, nem mesmo curto, a esperança republicana é avivada por firmes posicionamentos judiciais, como é o caso do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Sendo assim, o que se espera é que, o quanto antes, os brasileiros possam experimentar o verdadeiro significado do “15 de novembro”, a fim de que ele não seja apenas um feriado, mas um marco da revolução que busca respeito às garantias constitucionais da legalidade e da segurança jurídica, o que naturalmente contribui para o reestabelecimento da ordem, da segurança para os planejamentos tributários, e para o retorno à finalidade constitucional de estimular as atividades empresariais, facilitando, portanto, a integralização de bens imóveis ao capital social das empresas.

GIOVANA FURINE PEDROSA, é advogada na Jorge Gomes Advogados, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente. Pós-graduanda em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Tributário – IBET.