A POLÊMICA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA EXECUÇÃO FISCAL

Mecanismo através do qual se convoca para participar do processo terceiro cujo patrimônio se deseja alcançar, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica foi alocado, no Código de Processo Civil de 2015, como modalidade de intervenção de terceiros, estabelecendo um procedimento formal a ser seguido para tanto, o qual, sem a observância, não permite a interferência na esfera de direitos protegida.

A bem verdade, a desconsideração é meio para se atingir bens particulares dos sócios, por dívida da sociedade ou empresária; ou mesmo seu inverso, quando se deseja a constrição de bens da sociedade por dívida do sócio.

O Código de Processo Civil “processualizou”, em termos procedimentais, um instituto que, por muito tempo, permaneceu dominado pelos magistrados e pelos estudiosos do direito, o que assentava, na mesma proporção, insegurança jurídica.

Ocorre que, ao mesmo tempo em que a legislação vêm em busca de uniformização, nascem as dúvidas na aplicação, consequência lógica do extenso e complexo conjunto de normas jurídicas vigentes no país combinadas com a crescente cultura do ativismo judicial.

Ora, se o legislador de 2015 alocou e positivou o instituto em seu bojo, dedicando-lhe espaço em seus artigos como uma modalidade interventiva própria, não estaria então o sócio/sociedade empresária contribuintes seguros diante da prévia necessidade de um procedimento com direito ao exercício do contraditório para ter seus bens atingidos?

Nos Tribunais, a prática não parece suportar reflexo tão óbvio, principalmente quando se ocupa das particularidades de uma execução fiscal.

Desde a mudança legislativa, a desconsideração da personalidade jurídica é revolta de controvérsia sobre o cabimento – e a necessidade – da instauração do incidente para o redirecionamento da execução, seguinte os ditames processuais previstos no Código.

O conflito existe porquê, em que pese a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, a Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80) não prevê o uso do incidente. A situação se evidenciou em 2019, quando o próprio Superior Tribunal de Justiça, pelas 1ª e 2ª Turmas, posicionou-se de forma antagônica.

Para a segunda turma, como o crédito público em execução tem natureza tributária e goza de proteção especial, a aplicação do incidente de desconsideração da personalidade jurídica seria incompatível com o rito das execuções fiscais, não tendo sido este regime jurídico incluído pelo Código de Processo.

De outra banda, a primeira turma entendeu que o incidente não seria necessário nas hipóteses de redirecionamento já previstas no Código Tributário Nacional, bem como nas hipóteses em que a própria Lei prevê a responsabilidade subsidiária dos sócios na hipótese de não ser possível exigir o crédito tributário da sociedade empresária liquidada.

Ou seja: pelo entendimento da primeira turma, quando o caso concreto não se encaixa hipótese de redirecionamento já previsto, seria necessário o incidente de desconsideração, pela existência de uma situação não prevista no regime especial tributário.

Nesse sentido, seria necessário, por exemplo, instaurar incidente de desconsideração da personalidade jurídica para fazer o redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, desde que esta não esteja identificada na certidão da dívida ativa.

A conclusão da aplicação do instituto em execução fiscal, porém, continua sendo campo fértil para discussões, seja pela divergência notável na jurisprudência, seja pela possibilidade de serem levados novos debates à apreciação do Poder Judiciário, expondo argumentos que não excluem o nascimento de um terceiro entendimento.

Portanto, é possível concluir que diante da insegurança gerada pelas interpretações divergentes da Jurisprudência, revela-se de grande importância a correta identificação das situações envolvidas no caso concreto a fim de adequar a melhor estratégia a ser adotada nas defesas dos contribuintes.

ISABELA ESTEVES TEMPORIM, é Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Presidente Prudente (SP) – Associação Educacional Toledo. Pós-graduanda em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Tributário – IBET.