ADIs sobre bloqueio sem autorização judicial saem do julgamento virtual do STF – 12/06/2020

Após um destaque do ministro Alexandre de Moraes, foram retiradas do julgamento virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) na última segunda-feira (8/6) a ADI 5881 e as demais ações que questionam a constitucionalidade da lei de 2018 que autoriza a União a fazer o bloqueio bens de devedores sem autorização judicial.

O relator das ações, ministro Marco Aurélio, votou a favor dos interesses dos contribuintes. As ADIs 5881, 5886, 5890, 5925, 5931 e 5932 são julgadas conjuntamente.

Por meio do instrumento chamado de averbação pré-executória, bens como imóveis e veículos podem ser executados depois de o débito tributário ser inscrito na Dívida Ativa da União. Após a localização do bem, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) fica autorizada a notificar o devedor, que tem cinco dias úteis para quitar o débito. Caso contrário, o bem fica indisponível para venda.

A previsão está no artigo 25 da lei 13.606/2018, regulamentado pela portaria PGFN 33/2018. O dispositivo ainda permite que a Fazenda comunique a inscrição em Dívida Ativa a serviços de proteção do crédito e averbe a Certidão de Dívida Ativa (CDA) nos órgãos de registro de bens sujeitos a arresto ou penhora, tornando-os indisponíveis.
A permissão para bloqueio sem autorização judicial foi incluída na lei que instituiu o Refis do Funrural no governo Michel Temer.

Marco Aurélio: sanção política

Antes do destaque de Moraes, estava disponível no site do STF o voto do relator do caso. O ministro Marco Aurélio atendeu ao pedido dos contribuintes para considerar inconstitucional o trecho da lei de 2018, por entender que a averbação da CDA é uma sanção política que coage o devedor a pagar os débitos tributários.

De acordo com a resolução 642/2019 do STF, o pedido de destaque retira o processo do ambiente virtual e faz com que, no plenário físico, o julgamento seja reiniciado.

Não há data prevista para que as ações sejam colocadas em pauta.

No voto, o relator chamou a averbação pré-executória de “verdadeiro desvirtuamento do sistema de cobrança da Dívida Ativa da União”, por permitir uma espécie de execução administrativa e unilateral de débitos. O bloqueio sem autorização judicial, segundo o ministro, é incompatível com os princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal, da razoabilidade e da separação dos poderes.

“O sistema não fecha, revelando-se o desrespeito aos princípios da segurança jurídica, da igualdade de chances e da efetividade da prestação jurisdicional, os quais devem ser observados por determinação constitucional, em contraposição à ideia da ‘primazia do crédito público’” escreveu.

Segundo o ministro, a averbação de CDA é uma “nítida sanção visando o recolhimento de tributo” e a Fazenda deve abandonar “a prática de fazer justiça pelas próprias mãos”.

“Qual a finalidade pretendida pelo legislador ao editar os preceitos questionados senão induzir, mediante ato de império, o devedor a satisfazer o débito existente?”, questionou. O relator comparou o bloqueio unilateral a sanções políticas como a interdição do estabelecimento e a apreensão de mercadorias.

Ainda de acordo com o ministro Marco Aurélio, a averbação de CDA também possui problemas formais. Isso porque foi instituída por lei ordinária, enquanto cabe à lei complementar estabelecer normas gerais de Direito Tributário. “O ato atacado não se limitou a disciplinar mera regra de procedimento de cobrança de tributos. Antes, ampliou o rol de instrumentos franqueados ao fisco voltados à satisfação do crédito, conferindo-lhe novo atributo mediante a garantia da indisponibilidade dos bens do devedor”.

Para o relator, o trecho é um “dispositivo estranho” na lei que institui o parcelamento especial do Funrural. O ministro ressalta que a autorização foi incluída nos menos de 20 dias da tramitação de urgência do projeto de lei 9.206/2017, apresentado depois de caducar a MP 793/2017, por meio da qual o Executivo propôs o Refis do Funrural.

“O cenário descrito é de molde a reconhecer o ambiente de crise legislativa há tempos instalado no âmbito da frágil democracia brasileira, marcada pela frequente opção por atalhos à margem da Lei das leis, a Constituição Federal – o que, na quadra vivenciada, tem se mostrado regra, e não exceção”, lê-se no voto.

Fonte: JOTA