STJ impede Fisco de usar dados de cartões – 17/07/2013

Uma decisão inádita do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não admitiu a exclusão de uma microempresa do Simples Paulista com base apenas em dados obtidos na Operação Cartão Vermelho, deflagrada em 2007 pela Fazenda do Estado de São Paulo. Não cabe mais recurso.
Na operação, o Fisco cruzou informações obtidas por meio das administradoras de cartões de crádito e dábito com as declaradas pelos contribuintes. Nos casos em que foram constatadas divergências, autuou as empresas por sonegação de ICMS.
A decisão á um importante precedente para os contribuintes autuados. Na ápoca, 93,6 mil empresas foram notificadas, de acordo com a Fazenda paulista. Em 2006, essas companhias teriam declarado ao Fisco operações de aproximadamente R$ 11,2 bilhões e as administradoras de cartão informaram que, no mesmo período, repassaram R$ 24,2 bilhões para esses estabelecimentos. Isso gerou aproximadamente 1,3 mil notificações, nos casos que se entendeu haver indícios de sonegação fiscal.
Contribuintes, porám, questionaram a legalidade dessa operação. Para eles, só pode haver a quebra de sigilo fiscal com autorização judicial e após a instauração de processo administrativo. Como esses processos de investigação foram iniciados apenas com os dados da Operação Cartão Vermelho, não seriam v&aacutelidos.
A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) de São Paulo, por sua vez, argumenta que a operação est&aacute respaldada na Lei paulista nº 12.186, de 2006. A norma exige que o contribuinte autorize as administradoras de cartão de crádito a fornecer à Fazenda paulista os valores referentes às suas operações como requisito para enquadramento no Simples.
O ministro Herman Benjamin, do STJ, entendeu, no entanto, que a Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz-SP) não poderia se basear na Lei Estadual nº 12.186, de 2006, para autuar, multar ou desenquadrar empresa do Simples.
Segundo o ministro, a Operação Cartão Vermelho inverteu a lógica do levantamento do sigilo das operações financeiras. Isso porque o Fisco buscou os indícios de irregularidades antes mesmo de abrir os processos administrativos. &quot&Eacute patente a ilegalidade do processo administrativo e da consequente exclusão do Simples Paulista. Isso porque não se pode transformar a exceção em regra, com evidente inversão do ônus da prova: o contribuinte á tratado constantemente como investigado, ou culpado, e não como inocente&quot, diz na decisão.
Para reforçar seu entendimento, Benjamin ainda ressalta que o Supremo Tribunal Federal decidiu recentemente sobre a impossibilidade de o Fisco quebrar sigilo fiscal sem autorização judicial. O caso foi analisado em 2010, pelo Pleno, que declarou inconstitucional o artigo 5º Lei Complementar nº 105, que autorizava a administração tribut&aacuteria a solicitar informações banc&aacuterias.
Para o advogado Párisson Andrade, sócio da Párisson Andrade Advogados, que defendeu a empresa no STJ, a decisão, juntamente com o julgado do STF, reforça a irregularidade da Operação Cartão Vermelho. &quotO Fisco, como principal interessado, não pode quebrar o sigilo do contribuinte sem decisão de um juiz&quot, afirma. A Fazenda não recorreu para a 2&ordf Turma do STJ e o processo foi encerrado.
Segundo Andrade, os argumentos a favor dos contribuintes são fortes. &quot &Eacute bem prov&aacutevel que as empresas ganhem essa discussão.&quot Para ele, a quebra de sigilo á ilegal e nem todas as companhias autuadas sonegaram impostos. Ele explica que h&aacute empresas de um mesmo grupo, por exemplo, que usam o mesmo CNPJ nas operações com cartões de crádito.
Em setembro de 2012, a Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo decidiu, por maioria, que são v&aacutelidos os autos de infração lavrados durante a Operação Cartão Vermelho. J&aacute no Judici&aacuterio, os contribuintes têm vencido na maioria dos casos no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).
Para os advogados Josá Eduardo Toledo, do Gaudêncio, McNaughton e Toledo Advogados, e Horacio Villen Neto, do Magalhães, Villen & Ferreira Santos Sociedade de Advogados, a decisão do STJ, ainda que seja de apenas um ministro, traz um forte precedente para as empresas. Como as companhias não têm ganhado na esfera administrativa, todos esses processos devem desaguar no Judici&aacuterio. Porám, segundo Toledo, &quotse houve diferença no cruzamento dessas informações á porque h&aacute algo estranho e traz uma prova forte de sonegação&quot. De qualquer forma, acrescenta, como essas provas foram obtidas com quebra de sigilo sem autorização judicial, essas autuações podem ser anuladas.
Por nota, a assessoria de imprensa da PGE de São Paulo informou que h&aacute diversos julgados favor&aacuteveis ao Fisco no TJ-SP. Porám, admitiu que esse á o primeiro caso analisado pelo STJ. Segundo a nota, &quoto Estado de São Paulo confia que a administração tribut&aacuteria nada mais fez do que atuar dentro dos limites traçados pela Constituição Federal (artigo 145 par&aacutegrafo 1º), ou seja, exerceu a atividade fiscalizadora que decorre de seu poder de polícia&quot. Ainda acrescentou que &quota vida financeira dos contribuintes de ICMS interessa ao Estado, não havendo que se falar em direito constitucional absoluto ao sigilo dessas operações&quot.
A Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo tambám informou por nota que &quotem todos os procedimentos fiscais são observados os princípios constitucionais e as garantias do contribuinte, não representando ofensa ao sigilo financeiro&quot. A Sefaz-SP ainda afirmou confiar &quotque o Poder Judici&aacuterio firmar&aacute jurisprudência pela legalidade da atuação fiscal decorrente da Operação Cartão Vermelho, conforme os precedentes [do TIT e do TJ-SP] j&aacute registrados&quot.
Fonte: Valor Econômico