Tributação indireta da economia digital – 22/03/2019

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Em tempos de comércio digital, o consumidor pode adquirir, remotamente, vários produtos ou serviços de origem nacional ou internacional por meio de aplicativos ou páginas na rede mundial.

Essa nova realidade apresenta distintos paradigmas de comportamento de consumo, a estabelecer novos desafios ao legislador para a tributação de impostos indiretos sobre produtos e serviços, dentre eles, o conflito entre a tributação sobre a venda (origem) e destino (aquisição), tendo em vista a possibilidade de localidade de consumo restar ausente de tributação sobre a operação econômica.

Referido problema, resultado da ampla mobilidade da economia digital, também é objeto de discussão pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em seus relatórios emitidos em 2015 e 2018.

Uma nova alternativa para a tributação consiste no deslocamento do fato jurídico tributário para o momento da aquisição

No Brasil, o problema da mobilidade tributária não é assunto novo. Durante um longo período o país sofrera, como têm sofrido, os efeitos nocivos decorrentes da guerra fiscal e, em um passado recente, necessitara de alterações no arcabouço constitucional para alterar modelo de venda para consumidores finais advindas de discussões travadas em razão da tributação do e-commerce.

Entretanto, com o progressivo crescimento da economia digital e suas características intrínsecas, os problemas e desafios no âmbito do direito tributário não se restringem mais no âmbito nacional, mas sim, mundial.

Atualmente, o fato gerador para definição do ICMS é a saída (venda), momento que impossibilita a tributação sobre o fato econômico quando da aquisição, pelo consumidor, de serviços ou produtos do exterior ou ainda, como já discutido em alguns países, a tributação sobre a transação relativa a fatos econômicos entre consumidores (C2C).

Deveras, uma nova alternativa para a tributação sobre a economia digital consiste no deslocamento do fato jurídico tributário para o momento da aquisição (destino), pelo consumidor, ao invés da saída (origem), como atualmente legislado.

Em regra, em razão da atual sistemática do recolhimento do ICMS, surgem duas figuras distintas, o contribuinte de fato, neste caso o consumidor, e o contribuinte de direito, o vendedor. Esse último elencado pelo legislador para realizar o recolhimento do imposto. Esta modelagem está a se tornar disfuncional diante das transações globais próprias da economia digital, sua alta mobilidade e ausência de presença física dos interessados.

Assim, como alternativa para esse desafio, apresentamos o deslocamento do fato gerador para o momento da aquisição, de modo a eleger o consumidor final como contribuinte do imposto de fato e de direito.

Em referido cenário, a ter o consumidor como contribuinte de direito, o legislador elegerá, de acordo com o artigo 121 do Código Tributário Nacional (CTN), um responsável para cumprir, junto ao Fisco, o pagamento do crédito tributário surgido dessa relação jurídica, que poderá ser o vendedor, o intermediário financeiro ou o intermediário comercial em ambiente virtual.

A nova sistemática de incidência do ICMS sobre transações digitais permitiria a sedimentação e efetivação do princípio do destino na tributação de consumo em determinadas operações envolvendo a economia digital, a despeito da alta mobilidade e ausência de presença física na operação.

Estarão sob este guarda-chuva todas as operações empresa-consumidor (B2C) e consumidor-consumidor (C2C). Uma simples modificação na Lei Complementar nº 87, de 1996, de modo a recepcionar esta proposta, transformaria a maneira como se tributaria o ICMS nas transações elencadas e positivaria uma fantástica evolução no sistema tributário brasileiro, que em nosso pensar, necessita de pequenos ajustes.

A funcionalidade e a praticidade, desta proposta, poderão ser estendidas ao Imposto sobre Serviços (ISS), a seguir a mesma modelagem.

E mais ousado ainda seria a fusão dos dois impostos (ICMS e ISS) em um só, ao estabelecer uma alíquota única com partilha entre os entes federados (estados e municípios), a terminar com anos de disputa judicial entre ambos nas transações em ambiente digital, a trazer a todos os partícipes da relação jurídica nascida, conceitos caros à tributação tais como: neutralidade eficiência certeza simplicidade, eficácia, equilíbrio e por fim, flexibilidade.

A proposta apresenta coerência na regulação doméstica que afeta as relações além-fronteiras, a reforçar padrões existentes na esfera internacional, além de melhorar a transparência, a certeza, a praticidade e a funcionalidade.

Fonte: Valor Econômico