O presidente Michel Temer irá decidir o futuro da medida provisória (MP) do programa de parcelamento de dívidas tributárias, o Refis. Conforme antecipou o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, na manhã de ontem, a Fazenda considera que a arrecadação já é satisfatória e defende internamente deixar a MP perder a validade. A postura da Fazenda provocou reação na Câmara dos Deputados.
Temer receberá hoje um grupo de parlamentares para decidir se apoiará a equipe econômica ou determinará a votação de um texto alternativo, com desconto maior nas multas. Parte da base ameaça se rebelar, às vésperas de a Câmara analisar a segunda denúncia criminal contra o presidente.
A arrecadação do Refis com a Receita Federal e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) chegou a valor considerado “satisfatório” pela equipe econômica e, para evitar “flexibilização” nas regras, a Ministério da Fazenda passou a defender que a MP 783 não seja mais votada, conforme antecipou o Valor PRO. Insatisfeitos, deputados procuraram o presidente da Câmara no exercício da Presidência da República, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para defender a votação.
O valor mais atualizado da arrecadação é mantido sob sigilo pela Fazenda. O líder do governo no Congresso, deputado André Moura (PSC-SE), disse a deputados ser de R$ 6 bilhões. Já Maia relatou que a informação da Receita é que já entraram nos cofres da União R$ 9 bilhões – mas ele próprio afirmou desconfiar dos números. A estimativa do governo era receber este ano R$ 13 bilhões, quantia considerada irreal pelos parlamentares.
A equipe econômica ainda espera que a arrecadação aumente mais até o fim do prazo de adesão, dia 29 de setembro, e passou a defender internamente que o governo trabalhe para não votar o texto negociado com o relator da MP, deputado Newton Cardoso Júnior (PMDB-MG). A proposta seria discutida ontem na Câmara, mas foi adiada de novo.
A ideia da Fazenda, segundo o deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), é deixar a MP 783 caducar para não ver flexibilizadas as regras do programa. “O André [Moura] me disse que o Henrique [Meirelles, ministro da Fazenda] não quer mais votar. O governo ficou semanas discutindo o texto, fez na versão que ele queria, mas agora eles querem deixar caducar, é um desrespeito”, disse.
Como a MP tem efeito a partir da publicação, as pessoas físicas e empresas que aderirem durante o prazo de validade da medida não perderão os benefícios. Mas havia expectativa de que o Congresso alterasse o texto, com regras mais benéficas para os devedores, e que só valerão caso o novo texto seja aprovado e sancionado – o que a Fazenda quer agora evitar.
Meirelles, o líder do governo, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e os deputados negociaram uma versão intermediária do projeto nas últimas semanas. Três concessões seriam feitas pelo governo: ampliação no desconto das multas, para até 70% aumento no que é considerada “dívida de menor valor”, de R$ 15 milhões para R$ 30 milhões, e redução no pagamento de entrada nestes casos para 5% da dívida – a MP exigia sinal de 7,5%.
Os deputados ainda cobravam a “unificação dos regimes”, com a permissão para que empresas usem créditos de prejuízo fiscal para abater débitos já inscritos na Dívida Ativa da União – esse tipo de benefício só está autorizado, na atual versão do Refis, para as dívidas ainda em discussão administrativa na Receita e que não foram para execução fiscal.
Diante da arrecadação “satisfatória” e da ameaça de que emendas fossem aprovadas no plenário, porém, a Fazenda passou a defender no governo que nem o texto do acordo seja votado. A Casa Civil e a articulação política tentam uma resposta de Meirelles sobre a questão dos créditos fiscais há semanas, sem retorno, o que foi interpretado como mais um sinal da falta de disposição.
A MP perde os efeitos se não for votada até o dia 11 de outubro. A intenção dos parlamentares é, com a aprovação, estender o prazo de renegociação das dívidas até 31 de outubro, data divulgada pelo próprio Meirelles em evento com empresários da indústria caso ocorresse acordo para votação.
A preocupação dos articuladores políticos é irritar a base aliada às vésperas de a Câmara receber a segunda denúncia criminal contra Temer.
Dois dos partidos mais fiéis a Temer na primeira denúncia, PP e PR estão na linha de frente das articulações para aprovar o Refis com regras mais atraentes para os devedores. “O presidente terá que decidir. A opção é política ou financeira”, afirmou o deputado Alfredo Kaefer (PSL-PR).
Ao saber do plano de deixar a MP caducar, o líder de um grande partido da base afirmou que “aí cai o governo”. O relator do projeto lembrou ainda que, apesar da posição da Fazenda, as negociações envolvem também outras parte do governo. “Existe de forma infeliz e míope para o país uma posição muito resistente da equipe econômica em não defender o texto apesar de muitas negociações”, criticou Cardoso.
Fonte: Valor Econômico