O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu ontem, em repercussão geral, que as dívidas da Fazenda Pública, no período anterior à expedição dos precatórios, devem ser corrigidas pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo – Especial (IPCA-E), em vez da Taxa Referencial (TR). E para os juros de mora deve ser utilizada a remuneração da poupança. O entendimento, por maioria de votos, beneficia milhares de contribuintes com processos em andamento.
Em 2016, a TR acumulou 2%, enquanto o IPCA-E 6,58%. O impacto é bilionário, segundo a Advocacia-Geral da União (AGU). Estava previsto, no orçamento do ano passado, em R$ 4,7 bilhões. A equipe econômica não contava com a decisão do STF, de acordo com o secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Mansueto de Almeida. Para ele, porém, alguns riscos fiscais incorporados na última mudança da meta podem comportar ao menos parcialmente os gastos decorrentes da decisão.
“Dentro da revisão de meta, há poucas semanas, a gente já trabalhava com margem para riscos. Por exemplo, um pouco de perda com o Refis, sobre o qual finalmente parece ter se chegado a um acordo para a votação. Então tem alguma margem”, disse.
Segundo ele, a margem é pequena e não haveria espaço para perdas mais expressivas. “Claro que você não pode ter frustração de R$ 10 bilhões ou R$ 15 bilhões. Mas tinha uma margem pequena para fazer frente a contingências”, afirmou, acrescentando que há riscos que não estão se materializando.
No julgamento (RE 870.947), seis ministros votaram a favor do parcial provimento de recurso apresentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), na linha do que decidiu o relator, ministro Luiz Fux.
O INSS questionava decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) da 5ª Região que adotou o IPCA-E, com base no entendimento adotado em julgamento anterior do Supremo sobre a correção de precatórios. Para o INSS, a correção nesse período deveria seguir o que determina o artigo 1º da Lei nº 9.494, de 1997, alterado pela Lei nº 11.960, de 2009, ou seja, a aplicação da TR. Porém, a maioria dos ministros entendeu pela inconstitucionalidade desse artigo.
Em seu voto, proferido no início do julgamento, em agosto de 2016, Fux, considerou que a TR seria um índice inadequado à recomposição da inflação. Fux mostrou, na ocasião, a diferença entre os índices que, na prática, poderia chegar a 30%. Para ele, não há motivo para aplicar critérios distintos de correção monetária de precatórios e de condenações judiciais da Fazenda Pública.
Já para os juros de mora, Fux adotou o índice de remuneração da poupança, apenas para débitos de natureza não tributária, como é o caso da disputa com o INSS. Em causas de natureza tributária, ficou definido que deverá ser usado o mesmo índice adotado para correção dos débitos dos contribuintes – a Selic.
Ficaram vencidos os ministros Teori Zavascki, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes, que votavam pelo provimento integral – aplicação da TR -, além de Marco Aurélio, que negava provimento.
O processo trata de pontos que não ficaram esclarecidos no julgamento que declarou inconstitucional a Emenda Constitucional (EC) nº 62. Na ocasião, o Supremo estabeleceu que a correção monetária dos precatórios deveria ser feita pelo IPCA-E para os novos títulos e TR para os expedidos até a data do julgamento (25 de março de 2015). No caso de precatórios tributários, deveria-se seguir os critérios pelos quais a Fazenda Pública corrige seus créditos.
Sem a definição, diversos tribunais passaram a aplicar o IPCA-E no período anterior ao da expedição do precatório. Entre eles, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e dois dos cinco Tribunais Regionais Federais (TRFs). Agora, com a definição do Supremo, todos os tribunais deverão aplicar o IPCA-E quando se tratar de correção monetária.
A advogada Luiza Perez, da Advocacia Ulisses Jung, afirma que “a decisão é importante para todos os contribuintes e até para o Judiciário, pois desestimula a apresentação de recursos infundados, já que a dívida será efetivamente corrigida”. No caso dos juros de mora, ficou mantido o percentual da poupança, como estabelece a lei.
Especialista em direito tributário, o advogado Rafael Watanabe, do Schneider, Pugliese Advogados, também considerou o resultado importante. O julgamento, segundo ele, garante isonomia ao entender que as dívidas do Estado tem que ser atualizadas pelos mesmos índices que adota. Watanabe afirma ainda que poderá ser possível, após o julgamento, pedir a diferença de valores pagos em dívidas do Estado que foram atualizadas pela TR. 
Fonte: Valor Econômico