Em períodos de safra agrícola o número de ações de indenização, propostas por produtores rurais face as indústrias de insumos, cresce consideravelmente. Tais ações, de uma forma geral, têm como objeto principal a recuperação de prejuízos sofridos nas lavouras causados por supostos defeitos nos insumos adquiridos pelos produtores rurais junto às indústrias.
Ocorre que, na maior parte dos casos, os postulantes deixam de demonstrar e comprovar o nexo de causalidade entre os prejuízos causados nas lavouras e o eventual defeito no insumo adquirido.
O nexo de causalidade busca aferir a relação de causa e efeito em uma relação jurídica, de forma a apurar eventuais responsabilidades no âmbito cível. Em outras palavras, o nexo causal é a ligação entre a conduta de determinado agente e o resultado danoso dele advindo.
Sem o nexo causal, elemento indispensável da responsabilidade civil, não é possível estabelecer o responsável pelo dano causado.
A comprovação é extremamente difícil, pois a quebra de qualquer lavoura pode estar associada a diversos fatores
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar caso análogo (Recurso Especial n° 1596081 – PR), conclui que faz-se imprescindível, para a configuração do dever de indenizar, a demonstração da existência de nexo de causalidade apto a vincular o resultado lesivo efetivamente verificado ao comportamento (comissivo ou omissivo) daquele a quem se repute a condição de agente causador.
Para se estabelecer o nexo de causalidade entre o defeito no insumo e a perda na lavoura, necessário se faria demonstrar cumulativamente que (1) o insumo tinha defeito ou estava fora das especificações e (2) o insumo foi exclusivamente responsável pela perda na lavoura do autor.
Ocorre que, no agronegócio, em função das peculiaridades inerentes a sua natureza, nem sempre é fácil demonstrar que um determinado insumo agrícola isoladamente tenha dado causa ao prejuízo postulado. Esta comprovação é extremamente difícil, pois a quebra de produtividade de qualquer lavoura e cultura pode estar associada a diversos fatores, tanto na relação indireta ao homem, como por exemplo: clima, regime hídrico, pragas, doenças, ervas daninhas como na relação direta ao homem, como exemplo: preparo de solo, profundidade da semeadura, calagem, manejo da cultura, mecanização, controle de pragas e demais doenças, sementes adequadas, aplicação de defensivos etc.
Neste sentido, para postular com legitimidade a reparação dos danos causados na lavoura, o produtor rural deve demonstrar e comprovar, além do defeito no insumo, que: (i) antes da plantação da lavoura supostamente perdida, fez análise do clima e de solo com o objetivo de apurar quais produtos e o quanto aplicar no solo (ii) manejou de forma adequada a lavoura, com aplicação dos produtos defensivos, corretivos, controle de pragas etc (iii) utilizou a variedade de sementes adequada e na forma recomendada (iv) respeitou os prazos de plantação (zoneamento) e (v) aplicou o insumo questionado na forma recomendada.
As constatações mencionadas podem ser realizadas de diversas maneiras, inclusive através de documentos, testemunhos e perícia técnica nas áreas locais de formação das lavouras questionadas e nas amostras dos insumos. Sem estas demonstrações fica praticamente impossível estabelecer uma relação de causa e efeito entre o insumo supostamente defeituoso e a quebra de safra do produtor rural.
Não obstante o disposto acima, a maior parte das ações desta natureza, propostas por produtores rurais, baseia-se em prova pericial técnica a ser produzida após a quebra da lavoura, o que, isoladamente, não tem o condão de comprovar a relação de causa efeito, pois é realizada em um momento em que não se consegue mais aferir aspectos relevantes como manejo do solo e da cultura.
Neste sentido, antes de propor qualquer medida que busque responsabilizar civilmente a indústria de insumo, o produtor deverá contar com um conjunto probatório robusto e que abarque todos os elementos e eventos possivelmente causadores de danos nas lavouras.
Marcelo Franchi Winter é sócio do escritório Vaz, Buranello, Shingaki & Oioli Advogados
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Fonte : Valor Econômico