Mudanças no PIS e na Cofins são prioridade para ajustar as contas – 02/05/2018

Após tomar posse no Ministério da Fazenda, Eduardo Guardia anunciou que deseja dar início à simplificação tributária no Brasil a partir de uma proposta de mudança na legislação que rege o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins). Neste ano, as discussões em torno da cobrança do PIS e da Cofins vêm ganhando força. Entre as principais proposições estão a unificação dos dois tributos, a exclusão do ICMS da sua base de cálculo e a definição de um conceito mais claro de insumo dedutível no regime não cumulativo.

Há algum tempo, a reforma tributária vinha ocupando o protagonismo nos debates em busca de formas de alinhar aumento na arrecadação sem penalizar os empresários. Agora, a equipe econômica do governo e especialistas no assunto se voltam a essas contribuições. De acordo com o ministro, a reforma do PIS e da Cofins vai “facilitar qualquer reforma tributária”. Ela terá a capacidade de reduzir o custo de cumprimento das obrigações tributárias e os litígios.

A ideia é que a reforma seja feita em duas etapas. “Primeiro, faremos do PIS, para não ter erro de calibragem nessa nova alíquota e, depois, a gente faz a Cofins. Então, é uma reforma em duas fases, que vai levar pelo menos dois anos para ser implementada. É melhor ir devagar e rumar na direção correta”, disse.


A implementação da reforma do PIS/Cofins deve levar pelo menos dois anos. Porém a proposta de mudança do tributo já está muito avançada e deve ser encaminhada ao Congresso ainda neste mês.


O objetivo é dar início a uma discussão sobre a simplificação de impostos no Brasil, mesmo que não haja tempo para a aprovação de uma reforma tributária até o fim do ano. “Isso é custo Brasil na veia. É custo para a administração tributária, para as empresas”, afirmou o ministro. Conforme informações do Ministério da Fazenda, atualmente, 80% dos litígios no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) são sobre PIS e Cofins.


Estas contribuições federais incidem sobre a receita bruta auferida pela pessoa jurídica. Incidem tanto sobre o faturamento ou o auferimento de receitas para pessoas jurídicas de direito privado, quanto sobre o pagamento da folha de salários para entidades sem fins lucrativos determinadas em lei, e também sobre a arrecadação mensal de receitas correntes e o recebimento mensal de recursos para entidades de direito público.


A legislação do PIS/Cofins sofreu mudanças desde a sua criação e, atualmente, tem regras extremamente complexas sobre o cálculo do crédito tributário e muitos processos. Contudo a Receita Federal do Brasil no Rio Grande do Sul explica que há dois regimes de apuração: cumulativo e não cumulativo.


O regime de apuração chamado cumulativo é aquele que incide diretamente sobre a receita bruta, e não há desconto de crédito algum. Nesse caso, a alíquota do PIS é de 0,65% e a da Cofins, 3%. Este modelo é o cobrado das pessoas jurídicas com fins lucrativos e sem fins lucrativos (neste caso, é cobrado PIS sobre a folha de pagamento e sobre as receitas não decorrentes das atividades próprias).


O outro regime, mais recente, é o não cumulativo e foi instituído a partir de 2003 para o PIS e de 2004 para a Cofins. Nele, são aplicadas alíquotas mais elevadas – de 1,65% para o PIS e de 7,6% para a Cofins, que resultam em uma tributação total de 9,25%, e é permitido o desconto de créditos.


Esse regime foi instituído pelas leis nº 10.637, de 2002, em seus artigos 1º a 10 e nº 10.833, de 2003, em seus artigos 1º a 8º. Elas estabeleceram, respectivamente, o regime de incidência não cumulativa da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins, obrigatório para determinadas pessoas jurídicas. Em linhas gerais, esse regime de incidência implica o reconhecimento do direito de a empresa descontar do montante da contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins créditos calculados em relação a insumos e outras despesas.


Em razão dessa autorização para dedução de créditos, houve elevação da alíquota básica dessas contribuições, que passaram de 0,65% para 1,65% (contribuição para o PIS/Pasep) e de 3% para 7,6% (Cofins). A elevação não traduziu, obrigatoriamente, aumento do montante efetivo a pagar comparativamente ao regime anterior, já que pode ser reduzido dependendo do valor dos créditos da organização.


Em princípio, todas as pessoas jurídicas tributadas pelo Lucro Real estão sujeitas ao regime não cumulativo. Porém, explica o representante da RFN no Estado, pode haver também um regime misto. Uma determinada empresas pode ter parte das receitas pelo regime não cumulativo e parte sujeita ao cumulativo, o que contribui para a complexidade das contribuições.


Segundo Guardia, o ideal para a simplificação tributária seria a fusão do PIS/Cofins com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto Sobre Serviços (ISS), mas essa mudança seria complexa por envolver estados e municípios. “O ideal seria ter uma reforma que migrasse o PIS/Cofins para uma regra muito simples, para todos os produtos da economia, para nós podermos caminhar para o imposto sobre o valor adicional nacional, que faria também a fusão com o ICMS, o ISS e o PIS/Cofins.”


Exclusão do ICMS da base de cálculo é destaque na pauta

A proposição de exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins vem gerando divergências entre especialistas e preocupando empresários. Em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) terminou de julgar Recurso Especial nº 574.706, com resultado favorável aos contribuintes, ou seja, afirmando que o ICMS não deve compor a base de cálculo do PIS e da Cofins. Já para o governo, a notícia não é boa. A estimativa é de um impacto de R$ 20 bilhões no orçamento anual, e muitos outros bilhões em pedidos de restituição e/ou compensação.

A demora em publicar o acórdão do julgamento, no entanto, desanimou contribuintes, que esperavam que a decisão entrasse em vigor ainda no ano passado. A União ingressou, através da PGFN, com embargos de declaração pedindo modulação de efeitos, ou seja, para que a regra valesse apenas a partir da sua publicação e não tivesse de restituir o que foi pago a mais nos últimos cinco anos – prazo prescricional do tributo.


O resultado é que, até hoje, o processo ainda não transitou em julgado. “Desde o julgamento do Supremo Tribunal Federal reconhecendo a inconstitucionalidade até agora, já se passaram 14 meses. E a Receita Federal continua a exigir do contribuinte a contribuição do PIS e da Cofins com o ICMS”, lamenta o advogado especializado em Direito Tributário e sócio do escritório Juveniz Jr. Rolim Ferraz Advogados, Joaquim Rolim Ferraz.


De acordo com o especialista, o Judiciário tem reconhecido o direito dos contribuintes quanto à aplicação imediata do entendimento já proclamado pelo Supremo Tribunal Federal. “Os juízes e desembargadores vêm deferindo liminares autorizando a imediata desoneração tributária para o contribuinte. No entanto aqueles que não se valem dos mandados judiciais vêm sendo obrigados a pagar para a Receita Federal uma carga tributária que, sabidamente, é ilegal”, destaca Ferraz.


Segundo Gilberto Bento Jr., sócio da Bento Jr. Advogados, o principal ponto da decisão é dar aos contribuintes o direito de requerer diferenças financeiras dos valores pagos de ICMS de até cinco anos após o início do pedido judicial. “O fato é que foi reconhecida a repercussão geral no precedente, afetando cerca de 10 mil processos estagnados em instâncias inferiores e que aguardavam a decisão da matéria no âmbito do STF”, explica Bento Jr.


A grande preocupação com relação à restituição ou compensação do que foi e está sendo pago incorretamente é que isso poderia levar a ações erradas, fazendo com que diversos contribuintes começassem a, deliberadamente, excluir o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, antecipando-se à publicação do acórdão – quando a decisão de fato produziria efeitos.


“O contribuinte que ainda não entrou com mandado de segurança para aplicar essa decisão está pagando mais do que deveria, e não sabe se vai receber de volta, porque talvez seja modelado o efeito. Por isso, milhares de contribuintes estão recorrendo ao Judiciário para obter liminares determinando a imediata desoneração e o ressarcimento”, alerta Ferraz. De acordo com o advogado, esses processos têm andado rapidamente tanto em primeira quanto em segunda instâncias. Os pedidos de liminar têm sido apreciados em até cinco dias, e as sentenças vêm dentro de 180 dias.


É importante ficar atento às exigências da Receita Federal para que a decisão judicial tenha validade. Segundo o órgão, “no caso de a exclusão da base de cálculo das contribuições ser decorrente de decisão judicial beneficiando e alcançando a pessoa jurídica, decisão esta já aplicável e alcançando o período de apuração a que se refere esta escrituração, deve ser obrigatoriamente escriturado o Registro C111 – Processo Referenciado, bem como o correspondente registro de detalhamento do processo judicial, no Registro 1010 – Processo referenciado – Ação Judicial”.


Decisões abrem precedentes para julgamentos positivos

As decisões sobre o PIS/Cofins vêm abrindo precedentes, também, para a discussão do modo de cobrança de outros tributos. Conforme o advogado Joaquim Rolim Ferraz, do escritório Juveniz JR. Rolim Ferraz Advogados, há decisões de tribunais regionais determinando a exclusão do Imposto Sobre Serviços da base de cálculo do PIS e da Cofins. “O entendimento do STF é de que incluir o ICMS na base de cálculo da contribuição para o PIS e a Cofins é inconstitucional, porque não se pode tributar tributo. Só é possível tributar riqueza. A tendência é que outros tributos que vêm sendo aplicados dessa forma sejam revisados”, complementa o especialista.

Já Gilberto Bento Jr., sócio da Bento Jr. Advogados, adverte que esse julgamento também vale para excluir o ICMS de Substituição Tributária (ST), quando a empresa compra produtos com retenção antecipada. “Nesse caso, também é necessário ingressar com ação judicial para pedir ao fornecedor para ajustar o cálculo na hora da venda e, dessa forma, recolher valor menor ao Fisco, reduzindo assim o custo de aquisição”, diz o advogado.


Os efeitos da exclusão de ICMS ST preveem, além da redução de preço, a restituição de tudo que foi recolhido nos últimos cinco anos. “Os contribuintes enquadrados na substituição tributária têm um valor expressivo a ser restituído em dinheiro”, prevê Bento Jr.


Empresários temem instabilidade criada pelas alterações propostas

A Receita Federal quer unificar o Programa de Integração Social (PIS) e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). O projeto, segundo informações da Receita Federal do Brasil (RFB), está pronto e deverá ser aprovado pelo Executivo antes de ser encaminhado ao Congresso Nacional. A intenção, de acordo com o secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, é simplificar a tributação.

Atualmente, conforme explica Rachid, as contribuições permitem acumulação de crédito de forma diferente, dependendo do setor. “Se compro um refrigerador, ele tem crédito no processo produtivo. Se compro no escritório, não tem. A ideia é que tudo que você comprar vai ser crédito. Pagou x esse é o valor que vai creditar”, disse. “Isso gera litigiosidade grande”, pondera.


Contudo empresários, principalmente da indústria, estão receosos com a possibilidade de que “essa mudança, à semelhança de outras realizadas pelos governos anteriores, acabe em aumento da tributação”, explica o diretor de políticas e estratégia da CNI, José Augusto Fernandes. Desde 2017, a CNI realiza reuniões sobre o tema e, na última reunião do Fórum Nacional da Indústria, Rachid apresentou uma visão geral sobre a proposta.


Em tese, o projeto enfrenta um dos problemas centrais do PIS/Cofins, que é a necessidade de sairmos do crédito físico e passarmos para um modelo de crédito financeiro. “Poucos países adotam o sistema físico. O governo acaba especificando o que tem direito ao crédito em um processo de produção, o que gera um custo enorme para as empresas”, diz Fernandes. No modelo de crédito financeiro, tudo aquilo que a empresa paga e que está no processo de produção pode ser deduzido no final.


Contudo, explica Fernandes, as organizações criaram suas formas de lidar com esse sistema anômalo, algumas já estão recorrendo à Justiça para ajustar irregularidades e, o mais importante, o projeto do governo não inclui o setor de serviços na mudança. “Isso aumenta o risco de incidir sobre a indústria, que já é o setor mais tributado”, pontua o representante da CNI.


Jorge Rachid anunciou que a Receita tem um projeto pronto, que aguarda a apresentação formal ao Ministério da Fazenda e à presidência da República. Aprovado, será encaminhado ao Congresso Nacional para votação. “Eu entendo que seria satisfatório, a exemplo do que ocorre na Europa, termos poucas alíquotas. Temos que levar nosso sistema tributário para um sistema que o mundo conheça. Não posso falar para um investidor que quer investir no Brasil e me pergunta quanto paga de Previdência que isso depende do produto”, diz. E acrescenta: “Isso é errado”.


Fonte: Jornal do Comércio