O Superior Tribunal de Justiça (STJ) admitiu a possibilidade de liberação progressiva de garantias oferecidas em processo de execução fiscal (cobrança) à medida que dívidas parceladas forem pagas. O contribuinte que levou a tese ao tribunal, porém, não obteve o direito por ter sido excluído do programa por inadimplência. Mas o fato de os ministros terem aceitado a possibilidade pode abrir novos caminhos para essa discussão, segundo advogados tributaristas.
O julgamento é da 1ª Turma do STJ. O contribuinte teve sua conta bancária bloqueada em uma execução fiscal e os valores não foram convertidos à penhora – quando transferidos para a conta judicial. A quantia ficou bloqueada na conta corrente mesmo com a sua adesão a um parcelamento de dívidas tributárias.
Segundo decisão do relator, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, seguida pela maioria, a jurisprudência do STJ entende que a adesão ao programa de parcelamento não afasta a constrição de valores bloqueados. Isso porque, até que a dívida seja plenamente quitada pelo devedor, o Fisco pode retomar a execução fiscal em caso de inadimplência. “Deveras, é preciso atentar que a execução deve se processar de forma calibrada, a fim de se alcançar a finalidade do processo de execução, ou seja, a satisfação do crédito, com o mínimo de sacrifício do devedor, que não pode ser condenado ao desespero ou à quebra para cumprir a sua obrigação fiscal”, diz a decisão. (Resp 1266318/RN)
Nesse sentido, de acordo com o ministro, constatado o gradual pagamento das parcelas no parcelamento, “deve-se assegurar ao devedor a liberação proporcional dos valores constrictos, no intuito de manter a equivalência entre o débito tributário e a garantia da execução. “Ao reverso, impedir a liberação proporcional dos valores bloqueados causaria inescusável ônus ao devedor, notadamente nas hipóteses de parcelamento de longo prazo”, disse Maia Filho. O magistrado entendeu ser legítima a liberação progressiva e proporcional do valor da garantia ofertada pelo devedor, “na exata dimensão da parcela quitada”.
No processo, no entanto, a Fazenda Nacional comprovou que o parcelamento foi rescindido, por isso o pedido do contribuinte foi julgado prejudicado.
O advogado Pedro Teixeira de Siqueira Neto, do Bichara Advogados, afirma que o entendimento é super relevante e muda o paradigma que vinha sendo seguido pelo STJ para não reduzir a garantia nos processos de execução fiscal.
A tese, segundo Siqueira Neto, pode auxiliar diversas empresas que mesmo ao desistir da ação para incluir a dívida no parcelamento, ficam com as garantias (como carta de fiança ou seguro garantia) retidas no processo até o fim do pagamento da dívida. “Com essa decisão, podemos ver a possibilidade de discutir a renovação das apólices por valores mais baixos, com base na dívida atual da empresa ano a ano”.
Os advogados Rafael Augusto Pinto e Fernando Rezende Andrade, do Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, afirmam que o entendimento pode servir de parâmetro para as empresas que tiveram valores bloqueados, mas não penhorados (transferidos para uma conta judicial) antes da adesão ao parcelamento.
Nesses casos, em geral, alguns parcelamentos como o da Lei nº 11.941, de 2009, o Refis da Crise, estabelecem expressamente a impossibilidade de levantamento das penhoras. “No entanto, entendo que à medida que o parcelamento for sendo quitado, não é certo o contribuinte ter bloqueado o valor integral da dívida, sob pena, inclusive, de enriquecimento ilícito do Fisco”, diz Andrade. Isso porque, segundo o advogado, se dívida é de R$ 100 e o contribuinte já pagou R$ 50 no parcelamento, não faz sentido manter um bloqueio de R$ 100.
Para o advogado Maurício Faro, do BMA Advogados, a construção do entendimento do relator no STJ, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, foi bem interessante. “Há meios de satisfazer o crédito sem que seja necessário exigir uma garantia superior ao débito atual”, afirma.
Por nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que “a tese sequer foi votada pelos ministros, tendo sido deixado muito claro na sessão de julgamento que não se estava acolhendo referida possibilidade de liberação da garantia”. E que a Fazenda Nacional possui inúmeros argumentos contrários a tal tese. “Contudo, não houve maiores discussões sobre o assunto, porquanto o contribuinte foi excluído do parcelamento, suprimindo o interesse processual na discussão”.
Procurada pelo Valor, a advogada do contribuinte não retornou até o fechamento da reportagem.
Fonte: Valor Econômico