Em tempos de economia fraca e balança comercial oscilante, a política aduaneira do país é alvo de contestações pelo excesso de mudanças e exigências. Cabe ao Supremo Tribunal Federal a palavra final nas dúvidas na cobrança de tributos sobre importação e exportação. Só no STF, pelo menos 11 casos dessa natureza já tiveram repercussão geral reconhecida, mas aguardam julgamento de mérito. Em entrevista exclusiva à revista eletrônica Consultor Jurídico, o especialista em Comércio Exterior e Direito Aduaneiro Felippe Alexandre Ramos Breda (foto) critica a insegurança jurídica e diz que o empresário brasileiro vive em “constante assédio moral tributário”. O advogado, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados, defende um comércio mais simplificado, que deixe de lado complicações fiscais de menor em interesse à realidade do setor. De acordo com ele, é preciso equilibrar os freios e contrapesos entre governo federal e Receita para equalizar a carga tributária. Breda ainda se queixa da postura da maioria dos órgãos públicos, que impede o desenvolvimento das atividades de importação do país e faz com que empresários paguem tributos que não deveriam. Leia a entrevista: ConJur — A tributação sobre importados virou o centro das atenções principalmente devido à guerra fiscal e às políticas regulatórias do governo federal. Que desafios tributários o setor tem de enfrentar hoje? Felippe Breda — Ser importador em nosso país é ser herói. Vivemos em constante assédio moral tributário. Digo isso porque o importador tem que cumprir um sem número de exigências, paga os tributos antecipados e ainda corre o risco de não ter a carga liberada. Por exemplo, tivemos recentemente decisão do STF dizendo que o ICMS não deve compor a base de cálculo do PIS/Cofins em importação, por ofensa ao conceito do valor aduaneiro. Ou seja, desde que a lei foi editada, o contribuinte vem arcando com tributo ilegal. Passados quase dez anos, o Supremo invalida essa cobrança e agora a União quer limitar a tributação indevida só daqui para a frente. ConJur — Em que outros casos também houve distorções causadas por conflitos tributários? Felippe Breda — Na situação dos incentivos aos exportadores. O governo dá com uma mão, mas a Receita tributa o que é recebido a título de PIS, Cofins, CSLL e IR, a exemplo do Reintegra [Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras], regime em que se devolve às indústrias até 3% do valor exportado a cada trimestre. Mais um caso é a majoração da Cofins em 1%, pela legislação da desoneração da folha — que trocou as cobranças previdenciárias incidentes sobre o salário dos empregados por percentual sobre o faturamento —, a qual é totalmente ilegal, por ofensa a não-cumulatividade, não discriminação do GATT [Acordo Geral Sobre Tarifas e Comércio] e alíquota diferenciada indevida. ConJur — E quanto às obrigações acessórias? Felippe — Para se tornar importador a empresa deve se habilitar para tanto, passando por procedimento de avaliação e autorização junto à Receita, para fins de obter senha do sistema Radar para atuar no Sistema Integrado de Comércio Exterior, plataforma virtual das operações. Essa habilitação junto à Receita é um processo, por vezes, extremamente burocrático, em que se analisam os dados da capacidade econômica e operacional da empresa e seus recursos para atuar nas operações de comércio exterior. É concedido limite para atuação, que consiste em valor de importação a cada período de seis meses. A habilitação pode ser limitada (US$ 150 mil) e ilimitada. Na ilimitada, o importador corre o risco de ter sucesso em sua atividade e ter que dar satisfação do motivo de ter obtido tanto lucro. Um problema dessa avaliação é que ela é feita com base nos recolhimentos de tributos dos últimos cinco anos. Muitas empresas estrangeiras que pretendem operar não têm esse histórico e acabam obrigadas à integralização de altos valores para suporte de suas operações. ConJur — A dificuldade para as importações não é um estímulo à produção interna? Felippe Breda — A indústria precisa de insumos importados para seus produtos finais. Nosso comércio exterior é calcado nas commodities. Ou seja, nossa indústria não tem importado insumos para agregar produtos finais manufaturados, dependendo muito do mercado interno. Segundo a Organização Mundial do Comércio, esse tipo de conduta é prova da ausência de desenvolvimento de nossas negociações internacionais. Esquecemos que quem importa insumos o faz para agregar ao produto final. Veja que em nosso país temos dois procedimentos fiscalizatórios em comércio exterior que funcionam como breque às importações. São os procedimentos da Instrução Normativa 228/2002 e da IN 1.169/2011, da Receita Federal. Os procedimentos são louváveis, pois atuam contra empresas de fachada e operações fraudulentas. O problema está na duração de seus prazos, que podem chegar até seis meses, atingindo toda e qualquer empresa. ConJur — Com regras tão complexas, é possível que o importador pague tributos que não deveria? Felippe Breda — O empresário brasileiro vive afogado na avalanche de normas tributárias e aduaneiras despejadas pelos órgãos públicos. Assim, muitas vezes não se apercebem das ilegalidades que são cometidas e acabam incorporando à margem de custo e repassando à cadeia produtiva, perdendo em margem de preço e competitividade. A assessoria e consultoria especializadas são muito importantes.
Fonte: ConJur