Dívida tributária da empresa não atinge os bens dos sócios.

A simples falta de pagamento de qualquer obrigação tributária, não é hipótese suficiente a ensejar a responsabilidade patrimonial do sócio, no tocante aos débitos próprios da respectiva empresa da qual faz parte.

Não obstante a presente matéria vir sendo combatida pelos variados órgãos fiscais, que insistem em transmudar o comando expresso no art. 135 do Código Tributário Nacional, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em reiterados julgamentos, superou a divergência que havia na corte a respeito dos requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica e definiu que esse instituto exige a comprovação de desvio de finalidade da empresa ou confusão patrimonial entre sociedade e sócios.

Com isso, a tese até então proposta pelas Procuradorias das Fazendas Federal, Estadual e Municipal, no sentido de que “a simples falta de pagamento do tributo e a inexistência de bens penhoráveis do patrimônio da devedora configuram, por si sós, circunstâncias que acarretam a responsabilidade subsidiária dos sócios”, resta bastante enfraquecida.

Neste sentido, imperioso se faz observar que o art. 135 do Código Tributário Nacional determina que “os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado, respondem pessoalmente pelas obrigações tributárias da respectiva pessoa jurídica quando praticarem atos com “excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos”.

Assim, somente nestas hipóteses é que se justifica eventual responsabilização do sócio, pessoa física, perante os débitos próprios da sociedade. Há que se ressaltar, contudo, que a infração a lei, a qual o art. 135 se reporta, não é, sob nenhuma hipótese, a falta de pagamento do tributo, mas sim, infração à lei societária, momento o qual, determinado sócio, age em descompasso com a outorga que lhe fora transmitida pelos seus pares.

Desta forma, ao visualizarmos requerimento da Autoridade Fazendária no qual se pede o redirecionamento da dívida, da pessoa jurídica para a pessoa física, há, obrigatoriamente, a necessidade de se comprovar que a hipótese dos autos se amolda à previsão legal de responsabilização pessoal.

Por essa razão, a referida pretensão Fazendária deve demonstrar, de fora clara, os determinados atos praticados com excesso de poder, infração de lei, contrato social ou estatutos, comprovando, ao seu turno, desvio de finalidade da empresa ou confusão patrimonial entre sociedade e sócios, sob pena de completa afronta aos direitos fundamentais do cidadão, especialmente no que diz respeito ao direito de propriedade, sobejamente garantido pela Constituição da República de 1988.

Portanto, não é admissível de se entender, sob nenhuma hipótese, o redirecionamento da dívida, sem que se comprove de plano, a existência de dolo no descumprimento do dever de pagar tributos.

Assim, por todo exposto, insta salientar que em um Estado Democrático de Direito, não obstante os interesses arrecadatórios da Fazenda devam ser satisfeitos, sob nenhuma forma pode sobrepor aos direitos fundamentais do cidadão, sob pena de fazer letra morta todas as prescrições contidas na Constituição da República, colocando a deriva o próprio Estado de Direito.

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Luiz Paulo Jorge Gomes, é Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP e atualmente exerce a função de Conselheiro Titular da Primeira Turma Ordinária, da Segunda Câmara, da Primeira Seção de Julgamento do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda.