Contradições no planejamento tributário – 19/10/2018

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Há um consenso de que é dever do administrador empresarial buscar todas as alternativas legais possíveis para minimizar a carga tributária do seu negócio e maximizar seus resultados.

Impende a tanto o alto custo dos tributos deste país, que não raro reduzem absurdamente ou até eliminam a mínima rentabilidade que o empreendimento deve gerar para subsistir, manter empregos, remunerar o capital investido e proporcionar uma reserva para futuros reinvestimentos.

Sob uma legislação tributária complexa, não só com muitos tributos de várias alçadas, mas principalmente cada qual com uma regulamentação própria e confusa e em contínua edição de textos infralegais complementares, é natural que surjam brechas de planejamento tributário.

Não é impróprio afirmar que a cultura de contencioso fiscal já está consolidada no meio público e empresarial

No dia a dia da gestão o empresário é compelido a optar por soluções que podem implicar em certos riscos de contingencias. Basta acompanhar as publicações especializadas e verificar quantas teses são submetidas ao crivo administrativo e/ou judicial, reveladoras das condutas mais agressivas.

Também são valiosas e reveladoras fontes dessas informações as notas explicativas das demonstrações financeiras das sociedades anônimas, acompanhadas das qualificadoras dos riscos de perda remoto, possível ou provável, com ou sem a constituição das respectivas provisões.

São exemplos, dentre outros, o créditos de insumos na não-cumulatividade do IPI, ICMS, PIS e Cofins, por diversas razões, em função da legislação especifica de cada um desses tributos IPI sobre distribuidoras de produtos fabricados por outra empresa do mesmo grupo com alta alíquota IPI sobre revenda de produtos importados glosa de credito de ICMS oriundo de guerra fiscal compras idôneas de empresas que são posteriormente declaradas inidôneas porque não pagaram os tributos aquisição de precatórios para quitação de tributos.

Há ainda o aproveitamento de ágio interno perante o IR/CSLL antes da Lei nº 12.973/14, a multa isolada cumulada com multa de ofício ICMS e juros excedentes à Selic ICMS e tributos federais com multas de oficio extorsivas. A norma antielisiva aplicada aos tributos federais sem lei ordinária regulamentadora a restituição de ICMS pago a maior na ST IPI x ICMS x ISS na industrialização por encomenda ICMS x ISS nos serviços gráficos ISS e o local da prestação de serviços, além do PIS e da Cofins sobre ICMS e ISS são outros exemplos.

Vê-se que a reforma tributária é imperativa para diminuir a esfera de atritos entre Fisco e contribuintes, simplificar suas regras e podendo manter ou até ampliar a arrecadação com a ampliação da base de pagadores ao deixar sem espaço a tantos incidentes causadores de conflitos.

Porém, há uma outra visão negocial que tem se oposto a essa conduta combativa dos empresários. Notícias pipocam todos os dias de aquisições e fusões entre empresas brasileiras e estrangeiras.

Esse numero só não é maior porque, dito pelos próprios negociadores e intermediários, estão a restar cada vez menos empresas aptas a serem negociadas, em virtude das contingências fiscais que as “due diligences” apontam.

E essas restrições não se limitam a passivos tributários declarados e não pagos, por dificuldades financeiras, mas e sobretudo a riscos de condutas tributarias ousadas, que de um lado maximizam o capital de giro das empresas, mas de outro lado entravam as possíveis joint ventures que vierem a surgir, pela possibilidade das contingências se realizarem.

Às vezes uma retenção de parte do preço pelo comprador é suficiente para atenuar o impasse e levar avante o desfecho. Contudo, em fusões onde não há pagamento, mas mera troca de participações, há complicações para essa garantia, porquanto caução de ações não tem liquidez e nem sempre as partes estão dispostas a arcar com os custos de fianças e seguros, ou as instituições não concordam em oferecer essas garantias diante da magnitude dos riscos.

E sucede de as contingências serem de tal monta que inibem definitivamente a parte interessada. Sempre há notícias de negociações entabuladas que não se consumam por causa do conservadorismo das avaliações de riscos nas due diligences.

Portanto, chegamos a uma situação tipicamente kafkiana, pela qual o empresário necessita planejar ousadamente para competir no mercado e, ao mesmo tempo, está criando obstáculos para futuramente negociar sua empresa ou atrair um investidor/sócio estratégico.

É certo que essa maior rigidez de avaliação de riscos se dá mais com pretendentes estrangeiros, que têm certa dificuldade de entender a realidade tributaria brasileira, que é mundialmente atípica.

Brasileiros que se associam a brasileiros atenuam esses riscos, até porque muitas vezes ambas as partes envolvidas têm essa prática, e aí restrições não são aceitáveis.

Cabe aos consultores e advogados dos interessados estrangeiros orientá-los adequadamente sobre a cultura nacional de contencioso tributário, que incorpora variáveis como Judiciário que demonstra ser mais sensível a teses não aceitas administrativamente, parcelamentos generosos recorrentes e prescrição intercorrente, dentre outras.

A própria PGFN publica periodicamente as teses tributárias que estão pendentes de solução no Judiciário e quantifica as possíveis perdas que elas podem representar à União, caso os contribuintes sejam vencedores, o que por si só evidencia que as empresas são compelidas a essas teses, senão perdem competitividade. Não é impróprio afirmar que a cultura de contencioso fiscal já está consolidada no meio público e empresarial.

Fonte: Valor Econômico