Carf: distribuição de lucros de holding a detentor de direito é isenta de IRPF – 21/06/2019

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Uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) definiu que os lucros distribuídos por uma holding diretamente a uma pessoa física são isentos do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). A decisão, de uma turma da 2ª Seção de julgamento do tribunal, foi dada de maneira unânime em abril.

A tese fixada pela turma na ocasião foi a de que “a distribuição de lucros é isenta se dirigida a sócios e acionistas da empresa que promove a distribuição, não havendo vedação legal no trespasse [transferência] de valor referente à distribuição diretamente a um terceiro (detentor do direito), se o sócio beneficiado, mesmo por ato não formalizado, demonstra esse desejo”. Desta forma, o contribuinte que recorreu ao Carf evitou o recolhimento do IRPF sobre quase R$ 10 milhões recebidos como lucros.

“A decisão, por ser unânime, deixa muito claro que não existe vedação legal a este trespasse de dividendos”, comentou o advogado tributarista Bruno Marques Santo, do escritório Finocchio & Ustra Sociedade de Advogados. “A fiscalização da Receita ainda pode seguir na linha da autuação da Receita Federal, mas esta decisão ajudará a dar um norte aos planejamentos”.

Recursos recebidos da holding

A Receita Federal autuou o recorrente em 2008, após este ter considerado cerca de R$ 9,8 milhões como isentos de tributação pelo IRPF. Apesar de estes valores serem provenientes de uma empresa chamada Mizu, o valor não teria sido depositado por ela e sim pela RV, uma holding que controlava a Mizu. A RV possuía 80% da participação da Mizu, e o recorrente tinha 99% das cotas da RV.

Quando apresentou suas razões, o recorrente considerou não ser necessário o trânsito de tais valores pelas contas correntes da RV, uma vez que tais valores estariam contabilizados pelas empresas envolvidas e seriam coincidentes em suas datas.

Na 1ª instância, se determinou pela possibilidade a isenção. Como a decisão da Delegacia da Receita Federal de Julgamento (DRJ) supostamente se baseou em premissa não discutida no auto de infração, a pessoa física recorreu ao Carf.

O Fisco, ao contrário da contribuinte, considerou que a operação não teve amparo em nenhuma legislação, e que esta seria uma transação totalmente informal. Já o recorrente afirmou que, por ser dono de 99% das ações da RV, a operação poderia ocorrer sem maiores problemas. “Nada mais normal que a empresa autorizasse, mesmo sem nenhum aparato formal, a transferência direta do que tinha como direito da distribuição de lucros da Mizu­ para a conta corrente do recorrente”, alega a defesa, nos autos.

Ao julgar, o relator do caso, conselheiro Rayd Santana Ferreira, pontuou que a autuação se baseava em princípios equivocados. “Em nenhum momento há discussão ou dúvida acerca da participação social da RV ­ Empreendimentos na Mizu, ou seja, fato incontroverso aos olhos do fiscal (auto de infração)”, escreveu na decisão. Ao considerar que não havia impedimento legal para a operação, Ferreira votou por negar provimento, considerando incabível a operação.

Para Brunno Marques Santo, a decisão chama a atenção para a desburocratização da empresa familiar, e do conglomerado de empresas que usam uma holding intermediária. “Nunca tivemos uma segurança de uma decisão, que fixasse a tese assim. Havia uma certa dúvida, onde não era possível passar uma segurança a nossos clientes”, apontou.

O sócio do Duarte Garcia Serra Netto e Terra Advogados, Roberto Ribeiro, considerou que a fiscalização foi feita com base em informações bancárias, desconsiderando documentos contábeis e jurídicos. “Mas na impugnação ou, pelo menos, no recurso, foi demonstrado que havia justificativa para aquele pagamento direto. Uma vez que tanto a empresa geradora do lucro quanto aquela que seja a beneficiária direta tenham declarado adequadamente as declarações, não houve ilegalidade”, ponderou Ribeiro, que analisou o caso a pedido do JOTA.

Segundo o tributarista, “não há obrigatoriedade do fluxo financeiro de passar para a sócia pessoa jurídica quanto para a sócia pessoa física.”

Apesar de considerar a decisão correta, o sócio do Machado Meyer, Fernando Colucci, não concorda com os pares, e considerou a operação como comum. “Minha opinião, antes mesmo desta decisão, era de que [a operação de distribuição de lucros como a analisada pelo Carf] é possível, não é um roteiro usual, mas não há nenhum impedimento jurídico”, argumentou o tributarista.”Com esta decisão, não muda nada, mas agora há, na jurisprudência, uma decisão bem específica”.

Processo citado na matéria

13896.004981/2008­-34

Ronaldo Moreira Vieira x Fazenda Nacional

Fonte: JOTA