Decididamente, conforme já observava Rui Barbosa, ainda no início do Século XX, civilismo tem como significado a contraposição do arbítrio, da força, da espada. É, em significado maior, o governo da lei, onde há a observância plena da ordem civil, da ordem jurídica. A Constituição nesta realidade é soberana, dela se deriva todo o contexto vivenciado pela Nação.
Por essa razão, o desempenho da função pública não é derivado de vontades pessoais, mas sim coletivas, tendo como condicionante uma ordem legal apta a regulamentar a prática daquele determinado ato.
Neste sentido, a supremacia do interesse público, como princípio geral do Direito, somente se justifica pela prevalência do bem-estar da coletividade, legítima beneficiária dos interesses do País, ou seja, interesse público é tão-somente a contemplação pública dos interesses individuais, considerados estes, integrantes de uma coletividade edificada, juridicamente, sob o manto do Estado.
Assim, a atividade desenvolvida pela administração pública é a gestão, nos termos da lei e da moralidade administrativa, de bens, interesses e serviços públicos visando sempre o bem comum. 
Porém, em que pese todo o direcionamento empregado pela Constituição no que se refere ao exercício da função pública, o que se verifica em algumas situações específicas é justamente a transgressão destes valores expressamente dispostos pela nossa Lei Maior, fazendo com que os interesses primários de nosso País deem lugar aos interesses secundários das pessoas políticas, entendidas estas, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Ora, não há que se confundirem os interesses primários, derivados dos anseios e prerrogativas da sociedade, com aqueles interesses individuais da Administração, muitas vezes representados tão-somente com o incremento financeiro do seu caixa. Estes, diferentemente daqueles, não têm qualquer predileção, e somente podem ser verificados quando coincidentes com os interesses que efetivamente visem o bem da coletividade.
Por isso, com a devida vênia, difícil se faz entender o comportamento de determinados agentes públicos que no desempenho de suas respectivas funções adotam conduta que desprestigiam completamente o anseio da coletividade, dando guarida apenas a um interesse que a pretexto de se denominar público, na verdade, é absolutamente individual, contemplando somente a vontade daquele órgão que o mesmo representa.
Neste ínterim, importante se faz a reflexão sobre os julgamentos administrativos promovidos pela Administração Pública em relação a processos requeridos pelos contribuintes tendo como enfoque os mais variados méritos, dentre os quais destacamos os fiscais, previdenciários, multas de trânsito, dentre tantos outros.
Não raras são as vezes que se visualizam decisões sem qualquer motivação, fazendo da importante função pública, um instrumento de prevalência dos interesses pessoais da Administração e que em nada se aproximam dos efetivos interesses públicos.
Este cenário é recorrente. Quantas vezes presenciamos ex-Ministros, ex-Secretários, ex-Agentes da Administração Pública que após entregarem os respectivos cargos, alteram completamente a direção daquilo que acreditam e, como em um passe de mágica, agora sob a bandeira da iniciativa privada, se juntam as vozes daqueles que até tão pouco tempo insistentemente discordavam. 
Até o ex-Secretário da Receita Federal, Sr. Everaldo Maciel, responsável por um dos maiores aumentos da carga tributária em nosso País, hoje distante do seu gabinete, discursa com o empresário brasileiro, invocando uma reforma tributária que realmente atenda os anseios da classe produtiva.
Ora, a representatividade derivada da função pública detém significado muito mais sublime do que os pequeninos interesses individuais dos respectivos órgãos. É nela que a democracia se realiza em sua maior grandeza. 
Por todo o exposto, somente com o amadurecimento de nossas instituições é que presenciaremos a supremacia dos efetivos interesses públicos, gerando, ao seu turno, uma realidade em que respeitadas a liberdade e a propriedade do povo, ver-se-á resultar o interesse geral, em contraposição ao interesse particular.
LUIZ PAULO JORGE GOMES, é Advogado, sócio da Jorge Gomes Advogados, Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP, Ex-conselheiro do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF.
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