Ambiente político breca julgamento sobre ICMS excessivo em energia – 28/11/2017

São Paulo – O Supremo Tribunal Federal (STF) deve demorar a colocar na pauta de julgamento a questão da cobrança seletiva de Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) por conta da pressão política e do volume de ações até o fim do ano.

Na opinião do sócio do Gaia, Silva, Gaede Advogados, Gustavo Damázio de Noronha, defensor do contribuinte que ajuizou a ação, por mais essencial que seja o tema, o STF estará até o fim do ano tomado por sessões para deliberar sobre o futuro de políticos investigados na Operação Lava Jato. Além disso, o advogado acredita que o tema é politicamente sensível por envolver a arrecadação estadual. “Existe pressão política porque os estados não querem perder arrecadação. Eles imaginam que um julgamento desfavorável irá prejudicar as contas públicas. Não tem dúvida de que essa questão financeira vai ser colocada”, afirma.

O especialista opina que o ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo no Supremo, ainda não colocou o tema em pauta em um momento em que os estados vivem crises financeiras graves e que se discute muito o déficit nas contas públicas. Um dos estados afetados pela ação seria justamente o Rio de Janeiro, que também pratica a alíquota de 25% em energia, e que está há mais de um ano em situação de calamidade financeira.

Todo o processo se originou de uma reclamação de empresa que questionou na Justiça o ICMS cobrado sobre energia elétrica em Santa Catarina. No estado, a alíquota que se aplica para as aquisições de energia e serviços de comunicação está em 25%, contra uma alíquota geral média de 17% para outros produtos e serviços.

A reclamação do contribuinte é que a Constituição Federal, no artigo 155, dispõe que o ICMS “poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços”, de modo que como a energia elétrica é um bem essencial não deveria ser taxada de maneira mais pesada do que a média dos outros produtos.

Em primeira e segunda instância, no Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a tese da empresa foi derrotada. No primeiro grau porque o juiz entendeu que o “poderá” inscrito no texto constitucional indicaria ser facultativo ao estado seguir ou não a seletividade para o imposto.

Já no segundo, o relator do caso no TJSC, desembargador José Volpato de Souza, entendeu que não houve ofensa à Constituição porque o legislador do estado atribuiu uma alíquota maior para a energia justamente para desestimular o consumo nos setores em que é mais elevado, bem como para evitar o desperdício. Decisão contra a qual a companhia se insurgiu, impetrando recurso extraordinário ao STF.

A boa notícia para o contribuinte, segundo a especialista em direito tributário do Nelson Wilians & Advogados, Lorena Araújo, é que diversos ministros do Supremo já se posicionaram a favor dessa tese em outros processos. “Em 2014, o ministros Teori Zawascki, Celso de Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia disseram que a seletividade do ICMS é obrigatória”, lembra ela.

Gustavo Damázio de Noronha defende que o constituinte não escreveu um guia de recomendações às assembleias legislativas estaduais, mas ofereceu um conjunto de regras claras que têm que ser seguidas. Além disso, Noronha avalia que se existem alíquotas diferentes, pelo que está escrito no texto constitucional, as menores devem ser utilizadas para tributar bens essenciais como energia elétrica e telecomunicações.

“Já que existem alíquotas diferentes, os serviços e mercadorias essenciais deveriam ter alíquotas menores. O que ocorre é uma facilidade maior de fiscalização nesses setores porque são poucas empresas, então o número de agentes que precisam ser acompanhados é menor”, conta.

Lorena ressalta que como o julgamento está inscrito sob o regime de repercussão geral, uma decisão tomada pelo Supremo irá vincular os juízos de todos os outros tribunais. “Vai colocar um ponto final a essa discussão que já vem de muito tempo. Haverá um entendimento definitivo.”

Desincentivo

De acordo com Noronha, em geral os estados cobram ICMS mais caro de bebidas alcoólicas e cigarros porque são produtos que deveriam ter seu consumo desincentivado, o que não faz sentido no caso da energia porque mesmo se houver estímulo a reduzir o desperdício não se pode prescindir desse bem. Na sua opinião, isso só serve para diminuir a produtividade do País.

“Os estados alegam que o ICMS não deveria ser utilizado de maneira protecionista, mas isso não basta. A nossa energia elétrica é a mais cara da América Latina apesar de nossa matriz energética ser de hidrelétricas e dos nossos recursos hídricos serem abundantes.”

Noronha destaca que o caso não tem praticamente nenhuma chance de ser resolvido ainda este ano por conta do calendário apertado, das sessões dedicadas a temas políticos e da sensibilidade do assunto, que envolve a arrecadação dos estados. Contudo, o advogado diz que é necessário que o processo seja julgado o mais rapidamente possível para que as empresas tenham um norte mais claro. “Seria um alívio para as companhias que consomem energia elétrica mais cara”, conclui.

Fonte: DCI