De tempos em tempos, impulsionado pela incessante necessidade de arrecadação, o Estado, por meio de seus entes políticos, “estimula” os contribuintes a quitar suas dívidas pelos afamados programas de parcelamento de débitos tributários.
Em condições normais, a relação jurídica tributária é extinta pelo pagamento ou compensação integral do objeto, dentro de determinado tempo. Os parcelamentos, portanto, são formas excepcionais de extinção da obrigação tributária, nas quais o prazo de pagamento do objeto se prolonga no tempo.
Ocorre que a carga tributária imposta aos contribuintes é tão onerosa que o Fisco, em períodos de baixa de arrecadação institui aos contribuintes condições “especiais” ou “excepcionais” de regularização tributária, que de tão frequentes deixam de ser especiais e passam a ser costumeiras, no Brasil.
Não obstante tratá-los como especiais, haja vista os nomes atribuídos, como o Parcelamento Especial (PAES), o Parcelamento Excepcional (PAEX), o Programa Especial de Parcelamento do ICMS (PEP), o Programa de Recuperação Fiscal (REFIZ), entre outros. 
É comum nestes programas, exigir que o contribuinte renuncie, expressamente, quaisquer alegações de direito relativamente à matéria cujo respectivo débito queira parcelar, ou seja, a finalidade desta “cláusula de adesão” é atribuir veracidade irrevogável aos fatos que constituíram àquele tributo e, além disso, impedir que o devedor utilize medidas jurídicas para discutir eventuais ilegalidades.
É o Estado tratando uma obrigação Ex Lege, que é a obrigação tributária, como obrigação contratual. Como se o contribuinte, ao aderir o programa, pudesse aprovar todas as situações jurídicas antecedentes ao parcelamento, sendo elas legais ou não, abdicando de reclamações daquele momento em diante. 
A título de exemplo, o Estado de São Paulo instituiu o Programa Especial de Parcelamento de ICMS (PEP), exigindo dos aderentes a renúncia de direitos sobre os débitos.
Por certo que os programas de parcelamento pertencem ao modal deôntico permitido (P), cuja subsunção do fato concreto (dívida tributária) à norma jurídica (programa) depende da escolha do contribuinte (adesão), que ao assim proceder vincula-se as regras enunciadas.
Isso não quer dizer que a opção do contribuinte convalida todos os atos administrativos do fisco, ligados ao respectivo débito parcelado, isto é, a renúncia de direitos exigido na adesão aos programas de parcelamento não é capaz de afastar o direito de o contribuinte discutir, posteriormente, eventuais ilegalidades daquele débito.
Um exemplo, também do Estado de São Paulo, é a Arguição de Inconstitucionalidade nº 0170909-61.2012.8.26.0000, na qual o Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado declarou a inconstitucionalidade da lei nº 13.918/09 para afastar a exigência dos juros de mora que excediam, e muito, a taxa SELIC.
Ora, ao pé da letra, pela exigência de renúncia que o Estado costumeiramente exige dos contribuintes, não seria possível ao poder judiciário anular um débito tributário inconstitucional (juros), o que é inadmissível em um Estado democrático de direito. 
Sequer a segurança jurídica seria argumento para sustentar a renúncia, afinal, o ordenamento jurídico já limita o exercício de um direito pelo seu titular, ora, a prescrição e a decadência são fatos jurídicos com essa exclusiva finalidade.
Assim sendo, a renúncia de direitos costumeiramente presentes como requisito para adesão dos parcelamentos tributários não impossibilita que o contribuinte acione o poder judiciário para declarar ilegalidades praticadas pelo fisco na constituição do débito e, consequentemente anular a dívida procedente do ato antijurídico.
MURILO YONAHA é Advogado da Jorge Gomes Advogados, pós-graduando em Direito Tributário no IBET.