STJ retoma análise de cobrança de IR sobre juros – 24/11/2010

A 1ª Seção do Superior Tribunal Justiça (STJ) – que reúne 1ª e 2ª Turma – pode definir hoje, pela primeira vez, se há incidência de Imposto de Renda (IR) sobre juros de mora. O tema tem gerado controvérsia entre as turmas do STJ, por isso foi encaminhado para avaliação pela seção. O caso a ser julgado envolve o ex-funcionário de uma empresa que, ao receber verbas trabalhistas e os juros em razão da demora pelo pagamento, pleiteia o não recolher do IR sobre valor dos juros.
Apesar de envolver pessoa física, o julgamento despertou a atenção das empresas, principalmente das que possuem altos índices de inadimplência de clientes, como bancos, concessionárias de energia e companhias de telefonia. Isso porque, se a decisão for favorável ao contribuinte, pode representar um precedente para excluir-se não só o recolhimento do Imposto de Renda, como também da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre esses juros.
O julgamento na seção começou em 2008 e tem sido interrompido por diversos pedidos de vista. Por enquanto, o Fisco tem levado a melhor. Dos cinco ministros que votaram, quatro decidiram pela incidência do IR. Faltam ainda três votos. Nas duas turmas que formam a 1ª seção, há julgados tanto a favor dos contribuintes quanto da Fazenda.
O advogado Igor Mauler Santiago, do escritório Sacha Calmon Misabel Derzi Advogados, que defende o trabalhador, argumenta que os juros de mora têm natureza indenizatória. Segundo ele, esses valores apenas reparam um dano à pessoa que demorou para receber o que lhe era devido, no caso as verbas trabalhistas. “Com isso, a pessoa pode ter tido seu padrão de vida reduzido ou ter que pedir empréstimos, para honrar seus pagamentos, o que comprova o dano causado pela demora ao receber”. Ele afirma que a doutrina trata os juros de mora como indenização, sobre o qual, portanto, não incidiria IR.
A tese, segundo o advogado, foi firmada na própria jurisprudência do STJ em discussões apartadas que tratam das duas premissas: da não incidência de imposto de renda em valores recebidos a título de indenização e de que juros de mora caracterizariam indenização por dano. “Agora basta somar os dois pontos para concluir-se que o imposto de renda não incide sobre juros de mora”, justifica.
Por outro lado, a Fazenda argumenta que esses juros não caracterizam indenização, mas sim o acréscimo na renda, sobre o qual incidiria o imposto. Os contribuintes passaram a ser vitoriosos em julgados de turma após a edição do Código Civil de 2002, que dá sinais de que os juros de mora deveriam ser tratados como indenização. Os julgamentos mais antigos, no entanto, eram favoráveis à Fazenda.
O advogado Maurício Faro, do Barbosa, Müssnich & Aragão afirma que propôs três ações sobre o tema nos últimos meses. ” O entendimento a favor de pessoas físicas pode ser estendido às pessoas jurídicas, já que o raciocínio seria o mesmo”. Segundo Faro, seria nítida a natureza indenizatória desses juros por se tratar apenas da recomposição dos valores em razão da demora ao tramitar a ação. O advogado João Agripino Maia, sócio do Xavier Bernardes e Bragança, também concorda. Para ele, é necessário demostrar que há uma distinção entre juros pagos em razão de um empréstimo, por exemplo, no qual há uma remuneração do capital, e os juros moratórios, que servem como uma penalidade pelo atraso no pagamento.
A disputa na seção deve ser acirrada na opinião do advogado Leonardo Mazzillo, do WFaria Advocacia, até porque há julgados da 1ª Turma que foram unânimes em favor do Fisco e da 2ª Turma em que todos os ministros foram favoráveis aos contribuintes. Caso haja empate, cabe ao presidente da seção, no caso o ministro Teori Albino Zavascki, dar a palavra final, segundo o artigo 24 do regulamento do STJ. Ele, no entanto, já votou a favor da Fazenda, quando ainda não era presidente da seção.
Procurada pelo Valor, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que a pessoa responsável pelo setor não estaria disponível para dar entrevistas. O órgão afirmou, porém, que o entendimento da Fazenda “é no sentido de que a incidência do IR decorre de texto legal expresso, que não pode ser afastado sem observância da cláusula de reserva de Plenário.”
Decisão libera correção monetária de imposto
Alguns juízes de primeira instância já proferiram decisões favoráveis às empresas para excluir a cobrança do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) dos juros moratórios. Os magistrados têm se baseado em decisões de turmas do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicadas a pessoas físicas.
Um exemplo é uma sentença recém-publicada da 23ª Vara Cível de São Paulo. Para o juiz do caso, o artigo 404 do Código Civil, de 2002, “conceitua e define a natureza jurídica dos juros moratórios, sendo categórico acerca do caráter indenizatório”. O magistrado também cita decisão da 2ª Turma do STJ, de relatoria da ministra Eliana Calmon, de junho de 2008, que reconhece a natureza indenizatória dos juros moratórios e a não incidência de imposto de renda.
O juiz liberou a empresa do pagamento do imposto de renda e da CSLL sobre os valores recebidos a título de juros. Ele ainda estendeu o mesmo entendimento para afastar a cobrança dos impostos da correção monetária. Assim, autorizou a compensação desses valores dos últimos cinco anos.
O advogado da empresa Leonardo Mazzillo, do WFaria Advocacia, afirma que a extensão da não incidência para a correção monetária é novidade e não está abrangida na decisão do STJ. “Porém, na medida em que não há incidência para juros de mora, pode-se usar o mesmo raciocínio para as correções, conforme a decisão”, afirma.
Uma outra sentença da 22ª Vara do Distrito Federal, também excluiu a cobrança dos tributos para os juros de mora, baseada no Código Civil. O juiz determinou a compensação desses valores nos últimos dez anos. Segundo o advogado da empresa, João Agripino Maia, sócio do Xavier Bernardes e Bragança, o escritório já vinha mapeando as decisões sobre o tema porque há grande interesse de empresas com um volume expressivo de contas a receber em discutir o assunto.
Adriana Aguiar – De São Paulo
Fonte: Valor Econômico