Paridade entre contribuintes e Fisco na composição do Carf motiva críticas em CPI – 03/06/2015

&#160A CPI que apura denúncias de irregularidades no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), em sua primeira audiência pública, nesta terça-feira (2), registrou críticas ao modelo de composição paritária do órgão, com igual participação de conselheiros indicados pelo Fisco e pelos contribuintes. Para o procurador regional da República Frederico de Carvalho Paiva, “a pretexto” de assegurar uma composição democrática o sistema vinha servindo para que “pessoas mal intencionadas” ocupassem cargos de conselheiro e passassem a “manipular” julgamentos.

– Nenhum país do mundo tem um órgão como o Carf, o que nos leva à seguinte reflexão: ou temos que exportar o modelo para outros países, porque ele é bom ou a gente tem que repensar esse modelo – disse Paiva.
&#160
O procurador vem coordenando a força-tarefa do Ministério Público Federal que apura denúncias de irregularidades nos julgamentos do órgão, &#160que é integrado por 216 conselheiros, metade técnicos e auditores da Receita Federal e a outra metade representantes de contribuintes indicados por confederações econômicas. O Carf decide no plano administrativos sobre processos em que os contribuintes contestam tributos e multas cobradas pela Receita Federal.
&#160
Os julgamentos estão suspensos desde o final de março, medida adotada depois que a Polícia Federal deflagrou a Operação Zelotes, na sequência das investigações para apurar atuação de quadrilha suspeita de influir para a reversão ter cobranças de tributos e multas. Há indícios de envolvimento de conselheiros e os desvios já confirmados chegam quase a R$ 6 bilhões, com prejuízo potencial total aos cofres públicos que podem alcançar R$ 19 bilhões.
&#160
Padrão “diferenciado”
Coordenada pelo presidente da CPI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), a audiência também ouviu o presidente do Carf, Carlos Barreto, e os delegados da &#160Polícia Federal Oslain Campos Santana e Marlon Cajado. Barreto reconheceu que o tribunal administrativo brasileiro possui um “modelo diferenciado” e admitiu que outras alternativas precisam ser discutidas. Porém, argumentou que a paridade não é a um problema por si mesmo.
&#160
– Os resultados se mostram ora bons ora ruins, mas não é a paridade em si que inviabiliza o modelo – sustentou.
&#160
Ao fim da reunião, a relatora da CPI, senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), adiantou que a sugestão de um novo modelo para o órgão deverá surgir dos trabalhos da comissão e resultar em proposição legislativa. Segundo ela, além da própria composição, deve passar pelo crivo dos senadores a desigualdade atual que impede o Fisco de recorrer à Justiça contra decisões do Carf que lhe sejam desfavoráveis, enquanto o contribuinte, na mesma situação, ainda poderá fazer uso da via judicial.
&#160
– É um modelo que favorece um lado em detrimento do outro, e isso não está correto – opinou Vanessa.
&#160
Ainda segundo o procurador Frederico Paiva, em suas investigações o Ministério Público verificou que o Carf é uma instituição “anacrônica, ineficiente burocrática e nem um pouco transparente”. Segundo ele, o órgão “copiou o que há de pior” da estrutura do Poder Judiciário, a exemplo de diversas instâncias de julgamento e uma infinidade de recursos.
&#160
– Não é à toa que um processo leva, em média, nada mais nada menos que oito anos para ser concluído. É um tempo demasiado longo, pois os tributos não podem ser cobrados enquanto durar o processo, o que produz prejuízos – disse.
&#160
Movimentações atípicas
Os delegados da PF esclareceram que uma das primeiras providências do trabalho policial foi verificar movimentações atípicas de valores por parte de servidores e conselheiros, assim como de empresas de consultoria que possuíam. Antes, a PF havia recebido denúncia anônima, por meio de carta, delatando o esquema de sonegação.
&#160
Segundo o delegado Marlon Cajado, entre saques e depósitos foram identificadas 163 mil transações financeiras suspeitas entre 2005 e 2013. Nas interceptações telefônicas, surgiram indicações de negociação de valores para favorecer contribuintes, entre os quais grandes empresas. Ao todo, estão sob suspeita 74 processos decididos pelo Carf.- Ainda precisamos aprofundar as investigações e assim montar a história de como realmente tudo aconteceu. Assim, teremos com atribuir culpa de cada um dos agentes, na medida de sua participação – explicou Cajado.
&#160
Correções
Barreto, o presidente do Carf, reconheceu que as denúncias de desvios no Carf causaram estarrecimento, mas salientou que os fatos não são “corriqueiros” no órgão, e sim “anormalidades” que precisam ser apuradas e punidas. Falou também das providências que estão sendo adotadas para fortalecer o Carf contra novos problemas, a exemplo da de uma coordenação específica para fazer a gestão dos processos em exame e cuidar do sorteio para a distribuição aos conselheiros.
&#160
Citou ainda a decisão do governo, por meio de decreto, garantindo salário de R$ 11 mil para que os conselheiros que representam os contribuintes. Antes, eles não recebiam nada. &#160Ao mesmo tempo, lembrou Barreto, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) baixou norma para impedir que conselheiros advogados profissionais continuem exercendo advocacia enquanto permanecerem no posto. O objetivo é dificultar que usem o cargo para captar clientela no órgão.
&#160
– Isso representa um ganho em termos de imparcialidade – afirmou.
&#160
Barreto informou ainda que ao longo da próxima semana o comitê de avaliação de indicações ao Carf examinará novos nomes de conselheiros, no esforço de retomar o quanto antes as atividades de julgamento. Segundo ele, 80% dos integrantes deverão ser trocados. Apesar da Operação Zelores, nenhum foi afastado por decisão do Ministério da Fazendo. Porém, muitos pediram para sair e outros não foram reconduzidos ao fim de seus mandatos.
&#160
Inquérito
Durante a audiência, o presidente da CPI informou que na segunda-feira (1º) a comissão recebeu cópia do inquérito aberto pela PF sobre a Operação Zelotes, inclusive com os dados sob sigilo bancário. Ataídes adiantou que as peças serão compartilhadas com todos os membros da comissão, os titulares e suplentes. Ao fim, ele reiterou a intenção da CPI de trabalhar de forma colaborativa com todos os órgãos envolvidos nas investigações.
&#160
– Vamos trabalhar compartilhando informações. Nosso objetivo único é detectar esse dinheiro que foi desviado do Erário e trazê-lo de volta aos cofres públicos, identificando corruptores e corruptos – afirmou.
&#160
O senador José Pimentel (PT-CE), um dos parlamentares que acompanharam a audiência, afirmou que gradativamente o Estado vai se organizando para “fechar os ralos” patrimonialistas que sugam o direito público. Disse que chegou a hora de isso acontecer no Carf, a seu ver uma instituição que precisa de ampla reforma. Ele sugeriu que as demandas entre Fisco e contribuintes sejam resolvidas por meio de negociação e arbitragem.
&#160
Fonte: Agência Senado
&#160