O IMBRÓGLIO ENVOLVENDO A REPATRIAÇÃO DE ATIVOS DO EXTERIOR

Sem qualquer pretensão de fazer um juízo de valor acerca dos motivos ensejadores da existência de determinado bem não declarado no exterior, mas tendo como premissa a situação factual que envolve inúmeros brasileiros, não temos qualquer dúvida que referida regulamentação traria importante resultado ao Brasil, não só por regularizar uma situação de amplo conhecimento e que muitos teimavam em não enxergar, mas também por trazer divisas para o País, em momento de evidente crise financeira e deficitária arrecadação tributária.

Pois bem, regulamentada a presente questão através Lei 13.254/2016 e a Instrução Normativa 1.627/2016, iniciaram os debates provenientes das dúvidas surgidas e, como normalmente ocorre, a interpretação por parte da Fiscalização vai além do que foi estabelecido na legislação em referência, se instalando também em relação a presente matéria, notória insegurança jurídica aos contribuintes que poderiam estar aderindo ao referido programa.&#160

Por essa razão, grande parte dos contribuintes estará postergando a sua adesão até o último momento possível – o dia 31 de outubro – na esperança de que o fisco mude sua interpretação.

Uma das grandes polêmicas surgidas diz respeito justamente àquilo que gera maior repercussão, ou seja, o valor que deverá ser informado para fins de regularização dos bens e pagamento da respectiva multa.

Neste sentido, conforme definido na legislação mencionada acima, para aderir ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), seria preciso declarar o saldo bancário da conta em 31 de dezembro de 2014.

Entretanto, a Receita Federal divulgou recentemente informações para que os contribuintes declararem também valores que foram gastos no passado, além do saldo em conta corrente estrangeira.&#160

Com isso, a Receita pretende que o contribuinte pague os 30% de tributos e multa sobre o maior saldo existente nos últimos anos, evitando assim, que a tributação ficasse menor para quem eventualmente tivesse utilizado os recursos pouco antes da data de 31 de dezembro.

Porém, a interpretação agora exarada pela RFB traz uma série de problemas operacionais para a adesão ao regime. O primeiro deles seria que o contribuinte precisaria apurar quais foram os recursos consumidos durante um intervalo bastante grande de tempo, em muitos casos, superior a dez anos e, muitas vezes as pessoas não têm dados suficientes para referida informação, além de também não existir histórico e nem tão pouco extrato para identificar essas movimentações.

Referido problema toma ainda maior proporção pelo fato de que se qualquer divergência de interpretação conduzir o contribuinte em sentido diverso da posição adotada pela Receita, a consequência será a perda da anistia, fazendo com que o contribuinte se sujeite a todas as penalidades, inclusive as de âmbito criminal.

Assim, em mais uma oportunidade se demonstra de forma clarividente a completa contra-mão que se encontram os propósitos do Fisco e daqueles que devem se submeter à sua imperial vontade.

A esse respeito, importante observar que o desempenho da função pública não é derivado de vontades pessoais, mas sim coletivas, tendo como condicionante uma ordem legal apta a regulamentar a prática daquele determinado ato.

Neste sentido, a supremacia do interesse público, como princípio geral do Direito, somente se justifica pela prevalência do bem-estar da coletividade, legítima beneficiária dos interesses do País, ou seja, interesse público é tão-somente a contemplação pública dos interesses individuais, considerados estes, integrantes de uma coletividade edificada, juridicamente, sob o manto do Estado.

Por fim, embora seja de nossa opinião que em um cenário de crescente troca de informações entre Países, no final das contas, os contribuintes não possuem alternativa senão aderir ao regime, é também certo que não há que se confundirem os interesses primários, derivados dos anseios e prerrogativas da sociedade, com aqueles interesses individuais da Administração, muitas vezes representados tão-somente com o incremento financeiro do seu caixa. Estes, diferentemente daqueles, não têm qualquer predileção, e somente podem ser verificados quando coincidentes com os interesses que efetivamente visem o bem da coletividade.

LUIZ PAULO JORGE GOMES, é Advogado, sócio da Jorge Gomes Advogados, Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP.

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