A corretora de câmbio e valores mobiliários Haitong Securities do Brasil, em uma decisão rara, obteve liminar no Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região para deixar de pagar PIS e Cofins sobre valores de incorporação e resgate de ações referentes à segunda etapa do processo de fusão entre a BM&F e a Bovespa, que ocorreu em 2008.
Assim como a Haitong Securities, diversas corretoras foram autuadas pela Receita Federal, que além das contribuições sociais, cobra IRPJ e CSLL dessas operações -conhecidas no mercado como desmutualização.
Esse procedimento ocorreu em duas etapas, nos anos de 2007 e 2008. Na discussão sobre a primeira fase, a Fazenda Nacional obteve diversas decisões favoráveis. Por isso, muitas empresas com processos sobre o tema aderiram a parcelamentos.
Antes dessa operação, a BM&F era uma associação sem fins lucrativos. Com a desmutualização foi transformada em sociedade anônima e incorporada à Bovespa. Desse processo resultou a BM&FBovespa e, em troca dos títulos emitidos, as corretoras e bancos receberam ações em valor correspondente. Após a substituição, instituições financeiras venderam as ações por meio de uma oferta pública (IPO).
Em 2008, com a reorganização societária, Bovespa e BM&F se tornaram a Nova Bolsa. Nesse momento, minoritários da Bovespa Holding receberam ações da empresa. As corretoras argumentam que não houve compra e venda de ações, mas uma substituição.
Em razão dessa segunda etapa, a Haitong foi autuada. A empresa recorreu ao Judiciário, após perder processo no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Perdeu na primeira instância, mas no TRF conseguiu afastar as contribuições sociais. O que não ocorreu em relação ao Imposto de Renda e CSLL. A empresa alega que as operações de incorporação e resgate de ações não integram seu objeto social e as receitas delas não poderiam ser consideradas como faturamento, para fins de incidência de PIS e Cofins (nº 5005873-07.2019.4.03.0000).
A desembargadora federal Monica Nobre, ao conceder a liminar, afirma que o empate no Carf (desfeito por voto de qualidade do presidente) mostra dúvida quanto ao cometimento da infração. Com base no artigo 112 do Código Tributário Nacional (CTN), decidiu de forma mais favorável à empresa. Ela citou precedente do Carf favorável ao pedido.
No começo do ano, a 3ª Turma da Câmara Superior manteve decisão da 1ª Turma da 4ª Câmara da 3ª Seção do Carf. Para o Carf, o resgate de ações preferenciais não se caracteriza como atividade empresarial típica das instituições financeiras que receberam as ações no processo de reestruturação. Por isso, não poderia ocorrer a cobrança de PIS e Cofins. Já em relação ao IR e CSLL, a cobrança foi mantida por causa da correção monetária. Segundo a desembargadora, houve aquisição de renda na operação de substituição dos títulos pelas ações e, por isso, existiria a tributação.
O advogado da empresa, Felipe Kneipp Salomon, do Levy e Salomão Advogados, destaca que o caso se refere à segunda etapa da desmutualização. No Carf, não foi julgada a parte da incorporação de ações desse processo, segundo ele.
A PGFN afirmou por nota que considera a decisão isolada e pretende recorrer, seja pelas peculiaridades da decisão, como a ausência de análise do mérito, ou pela jurisprudência favorável à Fazenda Nacional no TRF.
Ao contrário do que afirma a PGFN, Tiago Conde, sócio do escritório Sacha Calmon Misabel Derzi Advogados, afirma que essa é a primeira decisão de TRF sobre o tema. Segundo ele, o Carf costuma ser contrário aos contribuintes em casos de desmutualização e os valores das autuações relativas ao assunto são altos, por isso é importante o precedente favorável.
Fonte: Valor Econômico