Lei de repatriação pode sofrer mudança e preocupa governo – 20/07/2016

BRASÍLIA – A equipe econômica está preocupada com os rumores de que o programa de repatriação pode sofrer alterações no Congresso. Integrantes do governo afirmaram ao GLOBO que isso já tem provocado uma redução do número de adesões à repatriação e pode acabar prejudicando a arrecadação esperada para o ano, de R$ 25 bilhões, considerada essencial para o fechamento das contas de 2016. Até agora, ingressaram somente R$ 8 bilhões nos cofres públicos por esse programa.

— Quando o contribuinte acredita que vai haver uma mudança de regras, ele decide esperar para ver se vai encontrar uma situação mais vantajosa. Já estamos observamos isso em relação à repatriação — disse um técnico da área econômica.

ATÉ PARLAMENTARES SE MOVEM

Segundo esse interlocutor, se a expectativa com as receitas da repatriação forem frustradas, o governo pode acabar tendo de aumentar impostos já no segundo semestre deste ano. Entre os tributos na mira para uma ação emergencial está o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), um dos poucos que podem ser elevados sem necessidade de noventena, regra pela qual uma alíquota mais alta só entra em vigor passados três meses (90 dias).

— Nossa expectativa era que ingressassem, pelo menos, R$ 25 bilhões com a repatriação. O número poderia ser ainda maior, mas colocamos uma estimativa conservadora nas projeções. Agora, com essa movimentação de que o programa pode mudar, o número pode não chegar nem a isso — explicou o técnico.

Depois de uma ampla negociação entre governo e Congresso, a lei da repatriação foi aprovada definindo que os contribuintes que enviaram dinheiro ao exterior sem declarar à Receita poderiam regularizar esses recursos até 31 de outubro deste ano, pagando uma alíquota de Imposto de Renda (IR) de 15%, mais uma multa de 15%. Com isso, essas pessoas ficam perdoadas dos crimes de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal e falsificação de dados. A lei, contudo, criou algumas travas.

Ela não se aplica a detentores de cargos públicos de direção ou eletivos, nem aos cônjuges ou parentes consanguíneos até o segundo grau ou por adoção. Também não podem aderir ao programa pessoas que tenham sofrido alguma condenação penal, mesmo que em primeira instância. Mas o governo vê surgir um movimento de alguns escritórios de advocacia, e até de parlamentares, para tentar mudar a lei. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, alertou o presidente interino, Michel Temer, e aconselhou o Palácio do Planalto a não fazer qualquer modificação, trabalhando com o Congresso para não haver alterações. Segundo interlocutores, Temer foi convencido por Meirelles.

PRAZO MAIOR ABRIRIA BRECHA

Alegando dúvidas com relação às regras da repatriação, os defensores de mudanças pedem mais tempo de adesão ao programa. Mas, para isso, seria preciso apresentar um novo projeto de lei alterando os prazos, o que abriria espaço para outras modificações. Uma delas poderia ser exatamente retirar do programa o artigo que bloqueia o benefício para políticos. Isso favoreceria, por exemplo, parlamentares como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e sua família, que têm trusts no exterior. Também poderia ser retirado o impedimento de que pessoas com alguma condenação penal possam legalizar os recursos, beneficiando envolvidos na Operação Lava-Jato.

A incerteza em relação à repatriação é um dos fatores que a equipe econômica está analisando para definir o contingenciamento do Orçamento de 2016, que deve ser anunciado até o fim da semana. Como as receitas estão em queda por causa da recessão e é preciso liberar alguns gastos emergenciais, os técnicos não querem correr o risco de descumprir a meta fiscal do ano, de déficit primário de R$ 170,5 bilhões. Por isso, avalia-se fazer um corte de gastos de até R$ 20 bilhões.

Fonte: O Globo