Recente decisão da Justiça Federal de Minas Gerais, proferida em um mandado de segurança coletivo impetrado pela Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (ABRAPE), traz à tona importantes questões jurídicas relacionadas à regulamentação do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE). A decisão, que suspendeu a aplicação de exigências adicionais estabelecidas pela Instrução Normativa RFB 2.195/2024, reflete a necessidade de observância dos princípios da legalidade e da segurança jurídica no âmbito da administração pública.
O PERSE foi instituído pela Lei n° 14.148/2021, com o objetivo de proporcionar suporte fiscal e financeiro a empresas do setor de eventos, que enfrentaram severas dificuldades em decorrência da pandemia de COVID-19. A referida lei estabelece, de forma clara, os requisitos para a fruição dos benefícios fiscais, sem a imposição de condicionantes adicionais que possam restringir o acesso ao programa.
Entretanto, a Instrução Normativa RFB 2.195/2024 introduziu exigências que não estavam previstas na legislação original, como a regularidade fiscal e a inexistência de débitos no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin) e no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). A ABRAPE, ao impetrar o mandado de segurança, sustentou que tais exigências extrapolam os limites da legislação e criam obstáculos indevidos para a habilitação das empresas.
Ao argumento do princípio da legalidade, consagrado no artigo 5º, II, da Constituição Federal, que estabelece que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei, a decisão judicial confirmou o que vinha sendo questionado pelos contribuintes: que o poder regulamentar da Receita Federal deve se restringir à complementação da norma legal, sem inovar ou criar novas obrigações que não estejam expressamente previstas na legislação.
Ainda, há que se ter que a imposição de requisitos adicionais para a habilitação ao PERSE, sem previsão legal, poderia gerar insegurança para as empresas do setor, que necessitam de clareza e certeza para planejar suas atividades e investimentos. Manter as exigências adicionais violaria, portanto, o princípio da segurança jurídica, que visa garantir a previsibilidade e a estabilidade das relações jurídicas.
Não bastasse isso, a criação de barreiras adicionais para a habilitação ao PERSE, em um momento crítico para o setor de eventos, é desproporcional, uma vez que poderia inviabilizar o acesso aos benefícios fiscais e compromete a recuperação econômica das empresas. Sob esse enfoque, as exigências adicionais impostas pela RFB violam a própria proporcionalidade que as medidas adotadas pela administração pública devem ter, vez que ausente a relação de necessidade e proporcionalidade com os fins que pretendem alcançar.
É importante trazer que se trata de decisão judicial proferida em processo de mandado de segurança coletivo, que alcança inúmeros contribuintes associados à ABRAPE, o que pode vir a servir como um precedente importante para outras ações judiciais que busquem garantir direitos semelhantes a diferentes setores afetados pela crise. A expectativa é que a análise mais aprofundada das exigências impostas pela Instrução Normativa RFB 2.195/2024 leve a uma revisão das práticas administrativas, promovendo um ambiente mais favorável à recuperação econômica.
Diante do cenário exposto, a Jorge Gomes Advogados, especializada na atuação do contencioso tributário a administrativo, coloca-se à disposição para tirar eventuais dúvidas sobre o tema.
HEITOR JOSÉ SCALON RIBEIRO é advogado na Jorge Gomes Advogados, Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente. Pós-graduando em Direito Tributário no Instituto Brasileiro de Estudos Tributário – IBET.