FUNRURAL. Justiça Federal. TRF3. 1ª Instância.

PROCESSO 0010460-11.2010.4.03.6100
Trata-se de demanda de procedimento ordinário, com pedido de tutela antecipada, em que o autor, produtor rural inscrito como contribuinte individual, pede seja “reconhecida a declarada, com efeito ex tunc, a inexigibilidade da cobrança da contribuição instituída pelo artigo 1º da Lei 8.540/92 (FUNRURAL), que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei 8.212/91, com redação atualizada até a Lei 9.528/97”.O pedido de tutela antecipada é para suspender a incidência desses dispositivos e a exigibilidade de valores com fundamento neles.Intimado, o autor retificou o valor atribuído à causa, que passou a ser de R$ 62.143,56 (fls. 104 e 108/109) e comprovou o recolhimento da diferença de custas devida (fls. 100, 111 e 112).O autor pede a desistência “do pedido de repetição de indébito, constante da alínea d, item IV, da petição inicial” (fl. 108).O pedido de antecipação dos efeitos da tutela foi deferido para “suspender, relativamente ao autor, a exigibilidade das contribuições previstas no artigo 25, incisos I e II, combinado com o artigo 30, inciso IV, ambos da Lei 8.212/1991”. O processo foi extinto sem resolução do mérito, quanto ao pedido de repetição de indébito tributário, constante do item “d” da petição inicial, ante a desistência da pretensão, nos termos dos artigos 158, parágrafo único, e 267, inciso VIII, do Código de Processo Civil (fls. 113/115 e verso). Em face da decisão que deferiu o pedido de antecipação da tutela a União opôs embargos de declaração, cujo provimento foi negado (fls. 482/484). A União interpôs recurso de agravo de instrumento contra a decisão que antecipou a tutela, que foi suspensa pelo Tribunal Regional Federal da Terceira Região (fls. 542/544).Citada, a União Federal contestou. Suscita prejudicial de prescrição. Se esta for rejeitada, pleiteia a improcedência do pedido. Não especificou as provas que pretende produzir (fls. 131/146).O autor se manifestou sobre a contestação e requereu o julgamento antecipado da lide (fls. 154/161). Juntou documentos (fls. 162/480).Foi indeferido o pedido de expedição de ofícios às empresas compradoras e destinatárias da produção rural do autor (fl. 493).É o relatório. Fundamento e decido.Julgo antecipadamente a lide, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil. Apesar de haver questões de direito e de fato as relativas a este podem ser resolvidas pelos documentos constantes dos autos.A jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal FederalO Plenário do Supremo Tribunal Federal decretou incidentemente (controle difuso de constitucionalidade), no julgamento do Recurso Extraordinário nº 363.852, a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei nº 9.528/97 (Diário de Justiça Eletrônico de 22.4.2010), em acórdão assim ementado:RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PRESSUPOSTO ESPECÍFICO – VIOLÊNCIA À CONSTITUIÇÃO – ANÁLISE – CONCLUSÃO. Porque o Supremo, na análise da violência à Constituição, adota entendimento quanto à matéria de fundo do extraordinário, a conclusão a que chega deságua, conforme sempre sustentou a melhor doutrina – José Carlos Barbosa Moreira -, em provimento ou desprovimento do recurso, sendo impróprias as nomenclaturas conhecimento e não conhecimento. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – COMERCIALIZAÇÃO DE BOVINOS – PRODUTORES RURAIS PESSOAS NATURAIS – SUB-ROGAÇÃO – LEI Nº 8.212/91 – ARTIGO 195, INCISO I, DA CARTA FEDERAL – PERÍODO ANTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98 – UNICIDADE DE INCIDÊNCIA – EXCEÇÕES – COFINS E CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – PRECEDENTE – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. Ante o texto constitucional, não subsiste a obrigação tributária sub-rogada do adquirente, presente a venda de bovinos por produtores rurais, pessoas naturais, prevista nos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com as redações decorrentes das Leis nº 8.540/92 e nº 9.528/97. Aplicação de leis no tempo – considerações (RE 363.852, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 03/02/2010, DJe-071 DIVULG 22-04-2010 PUBLIC 23-04-2010 EMENT VOL-02398-04 PP-00701) O dispositivo desse julgamento é o seguinte:Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, conheceu e deu provimento ao recurso extraordinário para desobrigar os recorrentes da retenção e do recolhimento da contribuição social ou do seu recolhimento por subrrogação sobre a “receita bruta proveniente da comercialização da produção rural” de empregadores, pessoas naturais, fornecedores de bovinos para abate, declarando a inconstitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98, venha a instituir a contribuição, tudo na forma do pedido inicial, invertidos os ônus da sucumbência. Em seguida, o Relator apresentou petição da União no sentido de modular os efeitos da decisão, que foi rejeitada por maioria, vencida a Senhora Ministra Ellen Gracie. Votou o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, licenciado, o Senhor Ministro Celso de Mello e, neste julgamento, o Senhor Ministro Joaquim Barbosa, com voto proferido na assentada anterior. Plenário,03.02.2010.Sigo a orientação do Plenário do Supremo Tribunal Federal para declarar, incidentemente, como questão prejudicial ao julgamento do mérito, a inconstitucionalidade do artigo 1.º da Lei nº 8.540/92, que deu nova redação aos artigos 12, incisos V e VII, 25, incisos I e II, e 30, inciso IV, da Lei nº 8.212/91, com a redação atualizada até a Lei nº 9.528/97, até que legislação nova, arrimada na Emenda Constitucional nº 20/98, venha a instituir a contribuição.Adoto como motivos os fundamentos acolhidos pelo Supremo Tribunal Federal. Em síntese, entendeu o Supremo Tribunal Federal ser necessária a edição de lei complementar para a cobrança dessa contribuição, por se tratar de contribuição social nova, nos termos do artigo 195, 4.º, combinado com o artigo 154, inciso I, da Constituição do Brasil, por considerá-la não prevista no seu artigo 195, inciso I, na redação original, que autorizava a tributação do faturamento, e não da receita bruta.É irrelevante o fato de a cabeça do artigo 25 da Lei 8.212/1991 vigorar com a redação dada pela Lei 10.256/2001, editada sob a égide da Emenda Constitucional 20/98, que deu nova redação ao artigo 195 da Constituição do Brasil, para autorizar a incidência de contribuição social sobre o faturamento ou receita. A declaração incidental de inconstitucionalidade, pelo Supremo Tribunal Federal, dos incisos I e II do artigo 25 da Lei 8.212/1991, na redação da Lei 9.528/1997, exclui da ordem jurídica a base de cálculo e a alíquota previstas nesses incisos, sem os quais é impossível, ausentes esses elementos essenciais para a cobrança do crédito tributário (base de cálculo e alíquota), a exigência da contribuição a que alude a cabeça do assaz citado artigo 25.Ademais, conforme salientado acima, a maioria dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do citado Recurso Extraordinário nº 363.852, entendeu que há necessidade de lei complementar para a exigência da contribuição sobre a receita bruta proveniente da comercialização da produção rural da “pessoa física, proprietária ou não, que explora a atividade agropecuária, pesqueira ou de extração mineral – garimpeiro – em caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua”. A Lei 10.256/2001 é ordinária, razão por que é irrelevante o fato de haver sido editada já sob a égide da Emenda Constitucional 20/98.As contradições e omissões apontadas pela União no julgamento do Recurso Extraordinário nº 363.852, nas quais teria incorrido o Plenário do Supremo Tribunal Federal, que foram ventiladas em embargos de declaração opostos por ela, recurso esse que ainda aguarda julgamento, deverão ser analisadas pelo próprio Supremo Tribunal Federal.Até que o Supremo Tribunal Federal altere o resultado do julgamento do Recurso Extraordinário nº 363.852, no caso de acolher os embargos de declaração opostos pela União, sigo a orientação emanada desse julgamento. O princípio da supremacia da Constituição impõe a observância, pelas demais instâncias do Poder Judiciário, da orientação emanada do Supremo Tribunal Federal, ainda que não seja dotada de eficácia vinculante ou que possa ser alterada pelo próprio Tribunal, em razão de sua posição, em nossa ordem jurídica, de intérprete último e guardião da Constituição. O restabelecimento da contribuição de que tratam os incisos I e II do artigo 22 da Lei 8.212/1991Cabe salientar que a declaração incidental de inconstitucionalidade da contribuição em questão gera o restabelecimento da contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22 da Lei 8.212/1991.Em outras palavras, a partir da declaração de inexistência de relação jurídica quanto à obrigação de recolher a contribuição ora questionada são devidos os valores da contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22 da Lei 8.212/1991, restabelecida com a declaração de inconstitucionalidade do artigo 25 da Lei 8.870/1994. A prescriçãoNão há que se falar em prescrição. Antes da citação (fls. 108/109), a autora desistiu do pedido de repetição de indébito. O pedido versa somente sobre os valores vencidos a partir do ajuizamento da demanda e visa exclusivamente a declaração de inexistência de relação jurídica, pretensão esta imprescritível, tratando-se de relação de trato sucessivo.DispositivoResolvo o mérito nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para julgar procedente o pedido, a fim de declarar a inexistência de relação jurídica que obrigue o autor a recolher a contribuição prevista no artigo 25, incisos I e II, combinado com o artigo 30, inciso IV, ambos da Lei n.º 8.212/1991, na redação das Leis 8.540/1992 e 9.528/1997, devida pelo empregador rural pessoa física, com a observação de que esta declaração gera o restabelecimento da contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22 da Lei 8.212/1991.Condeno a União Federal a restituir as custas processuais despendidas pelo autor e a pagar-lhe os honorários advocatícios de R$ 2.000,00 (dois mil reais), atualizados desde esta data pelos índices das ações condenatórias em geral, sem a Selic, previstos na Resolução n.º 134/2010 do Conselho da Justiça Federal. O arbitramento dos honorários nesse valor se justifica em razão do pouquíssimo tempo de tramitação da demanda, sem necessidade de instrução probatória, e de versar ela sobre tese repetitiva.Com fundamento no 3º do artigo 475 do Código de Processo Civil, deixo de determinar a submissão deste julgamento ao duplo grau de jurisdição, por ser estar amparado em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal.Envie-se esta sentença por meio de correio eletrônico ao Excelentíssimo Desembargador Federal relator do agravo de instrumento interposto nos autos, nos termos do artigo 149, III, Provimento n.º 64, de 28.4.2005, da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da Terceira Região (fls. 542/544).Registre-se. Publique-se. Intime-se a União.