Fiesp quer mais prazo para pagar imposto – 07/02/2011

Cerca de 60 dias depois que copos e utensílios de vidros deixam a fábrica de Suzano ou da capital paulista rumo a algum ponto de venda dos clientes varejistas, a fabricante Nadir Figueiredo recebe o valor da venda dos produtos. Isso, em média. Grandes supermercados às vezes negociam prazos maiores. No caso da Fidalga, fabricante de escovas, o prazo médio de 60 dias costuma se aproximar dos três meses quando o varejista conta o prazo de pagamento ao fornecedor somente a partir da entrega das mercadorias. Mesmo demorando 60 ou 90 dias para receber pelas mercadorias, porém, as duas companhias recolhem os tributos devidos pela venda dos produtos até o fim do mês seguinte. Ou seja, pagam os tributos antes de ter recebido pela venda que deu origem à cobrança dos impostos e contribuições. Nem sempre, porém, há recursos em caixa para pagar os impostos. Nesse caso, a alternativa para não cair na inadimplência é ir para o mercado financeiro e usar o empréstimo para ficar em dia com o Fisco. Atualmente o descompasso entre o prazo para recolhimento de tributos e o recebimento das vendas para a indústria de transformação é, em média, de 49 dias. Isso criou, em 2010, um custo financeiro total de R$ 8,9 bilhões ao longo de toda a cadeia produtiva da indústria de transformação. Os cálculos são do Departamento de Competitividade e Tecnologia (Decomtec) da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e servem de base para um documento que será encaminhado hoje pela entidade ao governo federal. A Fiesp considerou o custo relativo aos juros no crédito tomado para pagamento dos impostos e também o custo financeiro no uso de capital próprio, em razão da perda de rentabilidade sofrida pelo recurso não estar mais disponível. O cálculo também levou em conta o impacto do repasse do custo financeiro nos preços. A Fiesp deve pedir ao governo federal prorrogação em 60 dias dos prazos de pagamentos de tributos. O pleito será levado também aos Estados. Para que o impacto na arrecadação seja amenizado, a Fiesp propõe que a cada mês o prazo seja alongado em cinco dias além do vigente. Assim em 12 meses podem ser atingidos os 60 dias. Segundo levantamento da Fiesp, as indústrias recebem o pagamento dos clientes 55 dias após as vendas, em média. O ciclo médio de produção da indústria de transformação é de 72 dias. Levando em conta que há tributos gerados desde o início do ciclo de produção – os tributos pagos sobre a folha de salários, por exemplo -, o descompasso entre o recolhimento do tributo e o recebimento da venda pode chegar a 127 dias. “Nem sempre eu preciso recorrer ao mercado financeiro. Mas mesmo quando eu não faço isso, há uma perda, porque a disponibilidade de caixa poderia ser aplicada para outras coisas, como investimento”, diz Raul Antonio de Paula e Silva, 1º secretário do conselho de administração da Nadir Figueiredo. Ele lembra que a empresa planeja dobrar a capacidade de produção da fábrica mantida em Suzano, no interior paulista. “Se eu não tivesse esse custo com o pagamento dos tributos, eu poderia estar com esse projeto em estágio mais adiantado.” Silva explica que a empresa já investiu R$ 35 milhões para a construção de um local de armazenamento para produtos acabados. A fábrica em Suzano, que atualmente produz 190 mil toneladas diárias, deverá ter capacidade de produção dobrada no fim de 2013 ou início de 2014. “Sem a necessidade de antecipar os impostos, eu poderia adiantar isso em cerca de seis meses”, diz. Manolo Canosa Miguez, presidente da Escovas Fidalga, também diz que, de qualquer forma, o pagamento adiantado de tributos tira o fôlego da empresa. A Escovas Fidalga recorre ao mercado financeiro em momentos tradicionalmente de menor disponibilidade de caixa. “O fim de ano, quando precisamos pagar o 13º salário, é um bom exemplo”, diz. “Quando há caixa não precisamos de crédito, mas com o recurso comprometido com os impostos, deixamos de fazer uma inovação ou melhoria tecnológica”, afirma. Miguez lembra que um dos tributos mais pesados é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) cobrado pelos Estados. Principalmente em razão da substituição tributária, que faz a indústria atualmente antecipar para as Fazendas estaduais o imposto que vai ser recolhido pelo varejista. “Nós na verdade estamos financiando o varejista. Porque pagamos para ele o imposto que vai dentro do preço da mercadoria. Mas nós recebemos somente depois de 60 ou 90 dias.” Segundo ele, a antecipação de ICMS tira de 13% a 16% da disponibilidade de caixa mensal da fabricante de escovas. Paulo Skaf, presidente da Fiesp, lembra que o “descasamento” entre as datas de recolhimento do imposto e de faturamento tem origem no período de alta inflação. Antes, explica, os tributos chegavam a ter prazo de recolhimento de 120 dias. E os prazos de pagamento das vendas eram igualmente dilatados. “Quando a inflação passou a aumentar, as empresas passaram a dar prazo menor de pagamento e o governo também reduziu o prazo para pagamento dos impostos”, diz Skaf. “O problema é que depois a inflação foi reduzida e as empresas voltaram a dar maior prazo aos clientes, mas o governo não voltou a dar mais tempo para pagar tributos.” “O descasamento traz um custo financeiro que é repassado aos preços”, diz José Ricardo Roriz Coelho, diretor do Decomtec. O levantamento da Fiesp mostra que 0,61% do preço final dos produtos industriais decorre do carregamento desse custo. O impacto é maior em razão da pesada carga tributária e dos juros elevados. “Quem perde mais é a empresa média”, diz Silva, da Nadir Figueiredo. “Há linhas de crédito especiais para as pequenas empresas e as grandes companhias têm capacidade de negociação. As médias não possuem nenhuma das duas vantagens.” Quando se trata de competitividade e concorrência com importados, diz Roriz, a tendência é de perda para toda indústria brasileira. “O descasamento entre o pagamento de impostos e o recebimento pelas vendas contribui para tirar a competitividade, mas é um problema simples de ser resolvido.” A prorrogação em 60 dias dos prazos para pagamento em impostos amenizaria o problema do descasamento, diz Roriz. Segundo o estudo, com a medida, 45,7% dos tributos recolhidos pela indústria ainda seriam pagos antes do recebimento das vendas. Mas restariam 54,3% que poderiam ser aplicados na produção industrial.
Fonte: Valor Econômico