A Fazenda do Estado de São Paulo vai implementar de forma gradual o sistema que classificará os contribuintes pelos riscos que oferecem aos cofres públicos, estabelecido por meio da Lei Complementar nº 1.320 – que instituiu o programa “Nos Conformes”. Haverá, primeiro, uma fase de testes, entre 17 de outubro e 28 de fevereiro, sem a aplicação de um dos três critérios criados para a definição das notas. 
É o que leva em conta o perfil dos fornecedores dos contribuintes. Esse é um dos pontos mais polêmicos da legislação. Foi motivo de forte resistência por vários setores da economia e também de críticas por parte de advogados na época da publicação da lei complementar, no mês de abril. 
Isso porque, na visão dos especialistas, aqueles que dependem de fornecedores de fora do Estado – e que, por esse motivo, não serão classificados – teriam dificuldades em obter as notas máximas. 
“Se considerarmos, por exemplo, uma indústria que só tem fornecedores no Estado e que estão bem no ranking, ela vai pontuar mais do que aquela indústria que tem somente fornecedores estrangeiros ou de outros Estados do país, mesmo que as duas cumpram com as suas obrigações”, observa a tributarista Gabriela Jajah, do escritório Siqueira Castro. 
A Fazenda, na fase de testes, utilizará, então, somente dois critérios para avaliar os contribuintes. Um deles é o pagamento atualizado de ICMS e o outro a emissão de notas fiscais compatíveis com os valores que são declarados ao Fisco. A classificação levará em conta fatos geradores ocorridos a partir do dia 7 de abril deste ano. 
As informações sobre a sistemática de classificação devem constar em uma resolução da Fazenda de São Paulo prevista para ser publicada no Diário Oficial do Estado de hoje. O texto trata sobre a forma como será executada a fase de testes. 
Os contribuintes serão qualificados por notas (A , B, C, D, E e NC, aquele que não foi classificado). Quanto mais próximos ao A , melhores avaliados vão estar e terão vantagens em relação aos demais – como o acesso facilitado à renovação de regimes especiais e ao aproveitamento de créditos acumulados. 
“Será um período de adaptação tanto para a Fazenda como para o contribuinte”, diz o secretário Luiz Claudio Rodrigues de Carvalho, titular da pasta. “Vai garantir que o sistema estará funcionando adequadamente no dia 1º de março [de 2019], quando começar a valer, e vai ao mesmo tempo permitir ao contribuinte conhecer as suas notas e ter a oportunidade de melhorá-las se for o caso”, acrescenta. 
O secretário afirma ainda que, apesar de não constar na resolução – e não ser utilizado nos testes -, o critério que leva em conta o ranking dos fornecedores para a classificação dos contribuintes não está descartado e deve ser usado mais para frente. “Como foi alvo de polêmica, nós resolvemos deixar para depois. Vamos, primeiro, esperar que os contribuintes se acostumem com os outros critérios”, frisa. 
Por enquanto, as notas vão variar, por exemplo, conforme o tempo de atraso do pagamento. Não poderá ser classificado como A o contribuinte com tributação vencida e não paga há mais de dois meses. Já aqueles que acumularam dívida por mais de seis meses serão enquadrados na categoria D. 
A Fazenda exigirá ainda, para classificar o contribuinte como A , um índice de 98% de aderência em relação à conformidade dos dados – valores indicados nos documentos e aqueles regularmente lançados na escrituração fiscal ou declarados. 
Contribuintes com menos de 90% serão enquadrados na categoria D, assim como os que não apresentaram ou não transmitiram as informações ao Fisco no prazo e nos termos previstos na legislação do ICMS. 
No sistema, o contribuinte vai conseguir verificar a sua situação item a item e o porquê da nota que lhe foi atribuída. As informações estarão disponíveis no site da Fazenda, por meio de acesso restrito, no Posto Fiscal Eletrônico. Ele vai precisar inserir o login e a senha ou terá acesso com o seu certificado digital. 
No período de testes, não haverá, no entanto, a chamada contrapartida aos contribuintes – que são os benefícios oferecidos aos mais bem avaliados. As vantagens as quais eles têm direito estão listadas nos artigos 16 e 17 da lei complementar. 
A resolução que será publicada pela Fazenda do Estado no Diário Oficial de hoje somente disciplina o sistema. A regulamentação da lei complementar será feita por meio de decreto, cuja a publicação, segundo o secretário da Fazenda, deve ocorrer somente no ano que vem. 
Há risco, no entanto, de esse sistema de classificação ser questionado na Justiça, segundo advogados. O motivo seria o tratamento desigual aos contribuintes. 
Luís Alexandre Barbosa, do escritório LBMF, pondera que é preciso esperar a regulamentação por meio de decreto para que se possa fazer uma avaliação mais aprofundada das regras. Se levar em conta o que consta na lei complementar, somente, ele vê ao menos três situações que podem ser interpretadas como inconstitucionais. 
Uma delas é a possibilidade de o contribuinte ser rebaixado no caso de auto de infração com a indicação de fraude. “O mero auto de infração já prejudicaria o contribuinte. Ele não teria sequer o direito de defesa. O processo sequer teria sido julgado administrativamente”, diz. 
O advogado questiona ainda a divulgação das notas dos contribuintes – isso não ocorrerá, no entanto, durante o período de testes, segundo a resolução que será publicada hoje. Ele entende como quebra de sigilo fiscal, o que também iria de encontro com o que estabelece a Constituição Federal. 
E o terceiro ponto trataria dos benefícios que serão concedidos aos mais bem avaliados. Ele cita a preferência para a utilização de créditos acumulados. “A máquina pública deveria funcionar para todos de forma isonômica”, entende. Para o advogado, o fato de o contribuinte não atingir os índices máximos não significa que ele seja um mau contribuinte. Aos considerados maus, ele afirma, existem outros procedimentos que poderiam ser aplicados.
Fonte: Valor Econômico