Bitributação é o principal entrave ao mercado da reciclagem – 03/10/2012

No fim do ano passado, o governo federal decidiu reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as empresas que comprarem resíduos sólidos recicláveis de cooperativas de catadores de lixo. A medida foi uma espécie de gota d´água no oceano, já que o setor paga mais cinco outros tributos para lidar com uma mercadoria que já havia sido anteriormente tributada e que virou lixo.
A expectativa atual do setor é no tocante à aprovação da PEC 01/2012 de autoria do senador Paulo Bauer (PSDB/SC), conhecida também como PEC dos Reciclados, que veda a cobrança de impostos sobre produtos elaborados preponderantemente com materiais reciclados ou reaproveitados.
“Não faz o menor sentido você tributar um produto que já sofreu esse processo, ainda mais quando isso ocorre em forma de cascata. É preciso corrigir essa distorção tributária”, clama André Vilhena, diretor executivo do Compromisso Empresarial para a reciclagem (Cempre).
O dirigente assegura que a taxação que ocorre “de forma inexplicável” é o principal entrave para o crescimento da cadeia de reciclagem no País. Ele é um dos principais palestrantes do Recicla Nordeste 2012, evento que será realizado de 17 a 19 de outubro no Centro de Eventos.
O presidente do Sindicato das Empresas de Resíduos Sólidos Domésticos e Industriais no Estado do Ceará (Sindiverde), Marcos Augusto Nogueira Albuquerque reforça o protesto.
“É incrível que o setor de reciclagem seja obrigado a pagar a mesma carga tributária que o restante da indústria. Se a gente for analisar a rigor, não se trata apenas de bitributação, mas de uma multi tributação”, aponta o dirigente do Sindiverde.
Aposta
Assim como André Vilhena, do Cempre, Marcos Augusto entende que a aprovação da PEC vai incrementar o segmento empresarial dos reciclados. “Não há a menor dúvida de que isso acontecerá. A Confederação das Indústrias, os sindicatos que representam o setor, enfim, todos as entidades representativas estão apostando na aprovação da PEC 01”, revela.
“É difícil trabalharmos com o lixo que precisa ser descontaminado para iniciar o processo de reciclagem, o que implica em custos. O fim dos impostos representará um grande incremento na atividade. O dinheiro das taxações seria investido na atividade com a aquisição de equipamentos, ampliação dos negócios e, consequentemente, na geração de mais empregos e assim toda a sociedade sairá ganhando”, conclui Marcos Augusto.
Dívidas
“Essa carga tributária excessiva inviabiliza muitas vezes o nosso trabalho, cuja rentabilidade já é pequena. Algumas empresas ficam endividadas”, protesta Vitor Gurgel, proprietário da Recicladora São José, que funciona em Maracanaú e trabalha, em média, com 400 toneladas de material por mês.
Além do IPI de 5%, os resíduos sofrem taxação de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de 12%, Programa de Integração Social (PIS) de 0,65%, Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) de 3%, Imposto de Renda (1,2%) e Imposto de Renda Sobre Lucro Presumido (1.08%), num total de 22,93%,
Economia
“Esses resíduos já foram tributados antes de virar lixo. Não é coerente que sejam novamente. O governo deve olhar melhor essa questão. Damos uma economia enorme ao Estado, que gasta R$ 150,00 por tonelada com a coleta e destinação final do lixo. Se deixássemos de reciclar essas 400 toneladas mensais, a Prefeitura teria que arcar com uma despesa de R$ 60 mil”, explica.
A Recicladora São José trabalha só com garrafa PET. Para se ter uma ideia da grandiosidade do que representa 400 toneladas recolhidas por mês, isso equivale a 7.200.000 garrafas. Até chegar à fábrica, o material passa pelas seguintes etapas: inicialmente, o catador recolhe o material na rua em seguida, o mesmo é conduzido aos depósitos dali segue para as cooperativas, onde é feita a triagem. Na quarta e penúltima etapa, ele é vira matéria-prima utilizada pela indústria no produto final.
Tudo que é transformado é embalado em carregamentos de 23 toneladas e vendido para empresas da Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, dentre outros Estados.
Emprego
A atividade dá emprego direto a 62 trabalhadores. Incluindo todas as pessoas que integram o ciclo produtivo, são cerca de duas mil ocupações. A maioria dos resíduos são coletados na Capital na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF).
“Não desperdiçamos nada. As embalagens de PET para óleo comestível, que não têm muito valor comercial, já que não se consegue retirar 100% do óleo que fica impregnado, são utilizadas para o fabrico de canos para esgoto que vendemos aos depósitos da periferia”, revela o empresário Vitor Gurgel.
A empresa iniciou em fevereiro último uma nova linha de produção. As tampinhas e os rótulos das garrafas, que até então eram negociadas com outras recicladoras, ficam ali mesmo. “Recuperamos e reciclamos as máquinas que se tornaram obsoletas ou estavam danificadas para montar um novo maquinário. Geramos mais dez empregos diretos com carteira assinada”.
Tampinhas
São processadas 60 toneladas de tampinhas por mês para a fabricação de fitilha, uma espécie de barbante de plástico. O resultado são seis toneladas do novo produto que é negociado em todo o Estado”, conforme Vitor Filho, sócio-gerente da Recicladora São José.
Recentemente, a empresa fez melhorias na estrutura com vistas a propiciar mais conforto e melhores condições de trabalho para os operários. Construiu um refeitório para os funcionários. Nos fundos, foi construído um campo soçaite, onde os trabalhadores disputam “peladas” após o expediente.
Descontos
O Decreto número 7.619, que determina as condições para a redução do IPI reza que os descontos devem variar de acordo com o tipo e a quantidade de resíduos utilizados no produto final. Plásticos e vidros são os mais contemplados, 50% a menor em relação aos 5% de IPI papéis, ferro ou aço (30%)cobre, alumínio, níquel e zinco permitem o abatimento de 10%.
Os senadores da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovaram, no último dia 12 de setembro, a PEC da Reciclagem. Ao justificar a aprovação do projeto, seu autor, o senador Paulo Bauer, destacou dentre outras coisas “que a qualidade de vida, o futuro do planeta e as condições de vida da humanidade são temas de preocupação do mundo inteiro”.
Por: Fernando Maia
Fonte: Diário do Nordeste